Um dos trabalhos escritos mais importantes da filosofia, é a Critica da Razão Pura, de Immanuel Kant. Apesar de Kant não descartar a existência de Deus como objeto de fé, ele critica os argumentos cosmológico, teleológico e ontológico, dizendo que Deus não pode ser objeto da razão, pois os argumentos possuem prós e contras que se contradizem. Por exemplo, enquanto podemos dar bons argumentos para o universo ter começado a existir (no argumento cosmológico), também existem boas razões para se crer que ele não começou a existir. Desse modo, usar a razão para chegar a Deus é contraditório, e Ele deve ser apenas objeto de fé.
Immanuel Kant e a Teologia Natural
Kant e o argumento cosmológico
Kant expõe um dos argumentos
antigos contra um regresso infinito de tempo para mostrar a racionalidade da
crença na origem do universo. Ele pensava que esse argumento estava correto.
Porém, o uso da razão também nos levaria a uma contradição. Ele argumentou que,
antes do universo começar, deveria haver uma espécie de tempo vazio. Ele disse:
Como o
começo é uma existência precedida de um tempo em que a coisa não é, tem que ter
decorrido previamente um tempo em que o mundo não era, ou seja, um tempo vazio.
Ora, num tempo vazio não é possível o nascimento de qualquer coisa, porque
nenhuma parte de um tal tempo tem em si, de preferência a outra, qualquer condição
que distinga a existência e a faça prevalecer sobre a não existência (quer se
admita que essa condição surja por si mesma ou através de uma outra causa).
Podem, por conseguinte, começar no mundo várias séries de coisas, mas o próprio
mundo não pode ter começo e é pois infinito em relação ao tempo passado. [1]
O raciocínio pode ser posto
dessa forma: Já que havia uma espécie de tempo vazio antes do inicio do
universo, e esse tempo possui momentos que não se distinguem um do outro pela ocorrência
de eventos, então não há motivo para crer que o universo teve um inicio em um
momento ao invés do outro. Desse modo, o universo não pode ter começado a
existir. Já que todos os momentos de tempo nesse vazio são iguais, não há razão
para o universo não começar em um momento ao invés do outro. Em todos esses
momentos, as mesmas condições são existentes. Todos os momentos possuem as
condições necessárias para a criação do universo. Desse modo, por que não antes
ou depois do momento em que foi criado? Se tal tempo vazio possui, em todos os
seus momentos, as mesmas condições, o universo não pode ter começado a existir,
mas existido eternamente.
Um exemplo que pode ser dado é
o congelamento da água: A água congela quando em uma região com menos de 0°.
Mas, se a região esta nessa condição sempre, então sempre a água estará
congelada. Seria impossível a água começar a congelar. Similarmente, se o tempo vazio sempre possui as condições para a
criação do universo, então o universo sempre existiu.
O primeiro problema a ser
apontado aqui, é a pressuposição do tempo absoluto Newtoniano, onde há esse “espaço
de tempo vazio” antes da origem do universo, onde não há tempo nem matéria. Em
uma visão de tempo relacional, o tempo começa em t=0. Em outras palavras, o
tempo começa com o universo, não havendo tempo antes. E isso é precisamente o
que a cosmologia moderna nos mostra. Dada a expansão do universo, Stephen
Hawking formulou um seu teorema da singularidade, o qual o fez concluir, “quase
todo mundo agora crê que o universo e o próprio tempo tiveram um inicio no Big
Bang.” [2] Filosofo Quentin Smith também explicou que o conceito de
singularidade “compreende a impossibilidade de estender a diversidade espaço-tempo para além da singularidade
[...] Isso exclui a ideia de que a singularidade é um efeito de algum processo
natural anterior” [3]
Cosmologo Alexander Vilenkin também é enfático ao dizer que antes do inicio do universo, “não há matéria e
não há espaço [...] também, não há tempo” [4] Apesar do ramo da filosofia da
ciência admitir que as teorias cientificas são mutáveis, esse não parece o caso
da origem do universo. Como disse Vilenkin, o teorema que ele, Arvind Borde e Alan
Guth desenvolveram mostram que modelos de universos eternos “simplesmente não
podem ser construídos.” [5]
Pode ser, de certo modo,
desonesto atacar um argumento antigo usando ciência moderna. Porém, já que
muita gente ainda utiliza dos argumentos de Kant como “cheque-mates” na
metafísica, então a ignorância dessas
pessoas deve ser esclarecida.
Um segundo problema com o
argumento de Kant, é que ele na verdade nos da razões para crer na pessoalidade da Primeira Causa. Supondo
que tal tempo vazio tenha existido, a pergunta é, por que o universo não
começou em qualquer outro momento? A resposta esta no principio da determinação, que diz que, se existem duas
possibilidades com a mesma probabilidade de serem realizadas, então sua
realização se deve a uma escolha livre daquele que causou. Como diz o filósofo
William Lane Craig:
...em uma
visão Newtoniana do tempo, um ser pessoal poderia escolher desde a eternidade
criar o universo em qualquer momento que ele quiser. Em uma visão relacional de
tempo, ele poderia desejar atemporalmente criar e essa criação poderia marcar a
origem do tempo. Então, a antítese de Kant, longe de refutar o inicio do
universo, na verdade provê uma iluminação dramática da natureza da causa do
universo; pois se o universo começou a existir, e se o universo é causado,
então a causa do universo deve ser um ser pessoal, que livremente escolheu criar
o universo. [6]
Então, a critica de Kant ao
argumento cosmológico parece não concluir o que ele queria, mas sim fortalecer
a conclusão do argumento.
Kant e o argumento teleológico
Apesar de ficar impressionado
com o argumento do projeto, ou, como ele chamou, argumento físico-teológico, Immanuel
Kant via dois problemas com ele. Em primeiro lugar, ele não prova a existência
de Deus, como ser onisciente, onipresente, amoroso, etc. Na verdade, no máximo
provaria a existência de um Arquiteto. Ele escreve:
Esta prova
poderia, quando muito, demonstrar um arquiteto do mundo, sempre muito limitado
pela aptidão da matéria com que trabalha, mas não um criador do mundo a cuja idéia
tudo estaria submetido, o que não basta de modo algum para o grande fim que
temos em vista e que é o de provar um Ser originário, plenamente suficiente. Se
quiséssemos demonstrar a própria contingência da matéria, teríamos que recorrer
a um argumento transcendental, o que, precisamente, se quis aqui evitar. [7]
Em primeiro lugar, devemos apontar
a irrelevância do argumento de Kant. De fato, mesmo se o argumento provasse apenas a existência de um Arquiteto do
universo, isso já seria o bastante para demonstrar a falsificação do
naturalismo. Como Charles Taliafello colocou:
... o que
Kant pensa ser muito modesto como consequência da teologia natural seria intolerável
por muitos naturalistas. Imagine que naturalistas contemporâneos como Narveson,
Bagger ou Rundle se tornando convencidos que muitos argumentos filosóficos “estabilizam
um grande arquiteto do mundo”. Isso não iria se encaixar bem com suas
afirmações centrais sobre a hegemonia explanatória do naturalismo [8]
Isso é similar à objeção de
Richard Dawkins ao argumento cosmológico, o qual diz que ele não prova um Deus
da Bíblia, mas sim apenas uma primeira causa transcendente. A resposta de Craig
a Dawkins, também é igualmente válida ao argumento de Kant: “O argumento não
pretende trazer tais coisas à luz. Seria uma forma bizarra de ateísmo — na
verdade, indigna desse nome — admitir que o universo tenha um Criador pessoal,
não causado, sem começo, imutável, imaterial, atemporal, não ilimitado pelo
espaço e inconcebivelmente poderoso.” [9]
Tal objeção também não
considera a conclusão do argumento cosmológico. Em um caso cumulativo, o
argumento cosmológico e o teleológico são usados em conjunto para mostrar Deus
como Criador do universo e Designer do universo. Não um “mero arquiteto” que
usou a matéria existente. Mas sim um Criador que criou o universo e usou de Sua
criação para realizar o projeto.
Em sua segunda objeção ao
argumento teleológico, Kant apela ao regresso infinito, em forma de um
dilema: Ou Deus é um membro da cadeia de causas naturais, ou Deus esta do lado
de fora da cadeia. No segundo caso, Kant diz que não prova Deus, pois ele esta
fora dos limites da razão humana. Isso, claro, é raciocínio circular, pois
pressupõe exatamente o que ele esta tentando provar.
O primeiro caso, porém,
levanta a questão do “inicio de Deus” e quem o causou. Se um regresso temporal
infinito mostra que o universo teve um inicio, então também mostra Deus como
tendo um inicio, sendo assim, contingente. Sendo contingente, levantaria a
questão de quem o criou.
Me parece que Kant realmente
não levou em consideração as consequências de um regresso infinito de tempo. Se
o passado fosse eterno, isso implicaria que o numero de eventos passados seriam
infinitos. Mas, se esse numero fosse infinito, então o hoje jamais chegaria. Pois
não importam quantos momentos de tempo se passem, ainda faltariam infinitos
para o hoje chegar. Supondo que o argumento tenha a fraqueza do tempo não ter
relação com o espaço e a matéria, pelo menos o tempo não pode ser eterno. Desse
modo, a causa criadora do tempo deve ser, necessariamente, atemporal, em um “espaço”
onde não há passagem de tempo. Desse modo, a segunda objeção de Kant parece
ser, no mínimo, tola.
Uma outra observação que deve
ser lembrada, é que tal objeção também se mostra ultrapassada por causa das
descobertas da ciência moderna citadas acima.
Kant e o argumento ontológico
Talvez a critica mais famosa
de Kant seja ao argumento ontológico de Santo Anselmo. De acordo com Anselmo, Deus é o Maior Ser
Concebível. Se algo pudesse ser maior do que Deus, então este seria Deus.
Porém, se Deus existe apenas na mente, então Ele não pode ser o Maior Ser, pois
existir na realidade é maior do que existir apenas na mente. Desse modo, Deus
deve existir tanto na mente quanto na realidade, já que Ele é, por definição, o
Maior Ser.
A critica de Kant vem do fato
de existência não poder ser um
predicado, ou uma perfeição. Por exemplo, se descrevermos duas maçãs exatamente
iguais, mas no conceito de uma colocarmos que ela existe, isso não adiciona
nada ao seu conceito. A existência não pode ser uma propriedade da maçã, enquanto a doçura ou a vermelhidão podem.
Kant escreve:
Assim,
pois, quando penso uma coisa, quaisquer que sejam e por mais numerosos que
sejam os predicados [propriedades] pelos quais a penso (mesmo na determinação
completa), em virtude de ainda acrescentar que esta coisa é, não lhe acrescento o mínimo que seja. Porquanto, se assim não
fosse, não existiria o mesmo,
existiria, pelo contrário, mais do
que o que pensei no conceito e não poderia dizer que é propriamente o objeto do
meu conceito que existe. [10]
Stephen Davis respondeu à essa objeção de forma inconclusiva. Mas, pelo menos, ele demonstrou que Kant
estava incorreto.
Davis nos faz pensar, por
exemplo, em cem dólares. Coloquemos dois cem dólares conceituais. No segundo os
cem dólares existem. Existe alguma diferença entre a existência e a
não-existência dos cem dólares? Claramente que sim. Os cem dólares existentes possuem
a propriedade de poder-ser-gasto, ao
passo que os cem dólares inexistentes não. Ele diz, “dos cem dólares reais, meu
conceito deles inclui a propriedade de ter-poder-de-compra-no-mundo-real.
Meu conceito do conceito de cem dólares não tem essa propriedade.” [11]
Então, pelo menos em algumas
circunstâncias, a existência pode adicionar propriedades ao conceito. No caso
de Deus, a existência adicionaria a propriedade de aniquilar o mundo real. Um ser onipotente claramente pode fazer
isso se existe. Ele também poderia interagir
com o mundo real, coisa que o mero conceito sem existência não pode. Desse
modo, a objeção de Kant parece não ter tanto poder quanto se imaginava.
Mas podemos ir além. Kant, na
verdade, parece ter tido um enorme esforço e uma enorme fama por uma objeção
irrelevante. Isso foi explicado pelo filósofo Alvin Plantinga. Ele diz:
A idéia de
Kant é, então, que não podemos fazer algo
existir por definição porque existência
não é uma propriedade ou predicado real no sentido explicado.
Se isso é o
que Kant quer dizer, ele certamente tem razão. Contudo, será isso relevante
para o argumento ontológico? Não poderia Anselmo agradecer a Kant por esse
interessante esclarecimento e continuar alegremente do mesmo modo? Em que
momento Anselmo tentou fazer Deus existir por definição acrescentando a existência
a uma lista de propriedades que definem um conceito? [...] Se este fosse o modo
de proceder de Anselmo – Se ele tivesse se limitado a acrescentar a existência
a um conceito que tem aplicação contingente – então na verdade o seu argumento
estaria sujeito à critica kantiana. Mas ele não fez isso nem tampouco esta
sujeito à tal critica. [12]
Desse modo, Kant na verdade
atacou uma forma de espantalho ao atacar o argumento ontológico. Pois, na
verdade, Anselmo nem se importaria com a critica. O que Anselmo quis
argumentar, de fato, era que a proposição “Deus existe” é necessariamente
verdadeira. Como Plantinga diz:
Anselmo pode
certamente concordar, enquanto seu argumento estiver sendo discutido, que a
existência não é um predicado no sentido explicado. Anselmo mantém que o
conceito o ser que nada maior pode ser
concebido é necessariamente exemplificado; este caso não é de forma alguma
inconsistente com a sugestão de que todo o conceito de uma coisa diminui em
relação à existência é equivalente ao conceito inteiro não diminuído dessa
coisa. Anselmo argumenta que a proposição Deus
existe é necessariamente verdadeira; mas nem essa afirmação nem seu
argumento para ela implicam ou pressupõem que a existência é um predicado nesse
sentido. [13]
Apesar disso, atualmente outras versões do argumento ontológico são utilizada por apologistas cristãos. A mais famosa formulada pelo próprio Plantinga, argumenta que, como Deus é o Maior Ser Convebivel, então Ele não pode ser meramente contingente. Desse modo, como Ele não é contingente e Sua existência não é impossível, Ele deve ser necessário, existindo em todos os mundos possíveis. Como o mundo real é um mundo possível, então Ele deve existir. Plantinga argumenta no seguinte silogismo:
- É possível que Deus exista.
- Se for possível que Deus exista, então Ele deve existir em algum mundo possível
- Se Deus existe em algum mundo possível, então Ele deve existir em todos os mundos possíveis.
- Se Deus existe em todos os mundos possíveis, então Ele deve existir no mundo real.
- Portanto, Deus existe no mundo real.
- Portanto, Deus existe.
O argumento moral kantiano
Existe uma versão do argumento
moral que o Kant defendeu, que hoje é conhecida como Argumento Moral Kantiano.
Em sua teoria ética deontológica, Immanuel Kant argumentou para sensos que todo
ser humano tem, o que ele chamou de Imperativo Categórico. Eles são três: a) Fazer
o que for universalizável, b) a humanidade é um fim, não um meio, e c) obrigações
devem ser realizadas pelo próprio dever (principio da autonomia).
O simples ato pelo ato não era
o bastante. Nós falhamos em cumprir esses atos morais. E Kant reconhecia o
problema da culpa nisso. A culpa é o sinal que falhamos nisso. O que levantou
outra questão: Há justiça perfeita nesse mundo? Para Kant, como a moral segue
um propósito, esse proposito deve se encontrar em estabelecer a justiça
perfeita. Como essa justiça não se encontra aqui (nós falhamos em cumprir o
código moral), então ela deve se encontrar na vida além dessa. O que isso
implica é na conclusão de que a vida além dessa deve manifestar a justiça
perfeita, por meio de um Juiz Perfeito. Como esse Juiz deve saber todos os
erros cometidos, ele deve ser onisciente. Como Ele poderia ser um Juiz
Moralmente Perfeito se estivesse apto a errar em seu julgamento? Ele deve saber
quais as circunstâncias que levaram as pessoas à Sua corte. Esse Juiz também
deve ser onipotente, para ser capaz de impor sua sentença para garantir justiça
perfeita. R. C. Sproul resume:
...a fim de
que os padrões éticos tenham algum significado (dessa forma nos impondo
obrigações), a justiça precisa existir; e, sabendo que nossa justiça é
imperfeita na terra, deve existir justiça perfeita na vida futura, e que ela
seja garantida por um juiz onisciente, onipotente, perfeitamente moral. [14]
Empirismo e Racionalismo sintetizados
Kant propôs uma síntese do
racionalismo e do empirismo. De acordo com o racionalismo, nosso conhecimento é
adquirido pela razão, ao passo que, de acordo com o empirismo, nós o adquirimos
pela experiência. A síntese de Kant pode ser colocado de forma simples dessa forma: A principio, nós temos nossa experiência sensível e, depois, nós utilizamos a
razão imediata para adquirir a informação. Como essa razão é autônoma, o que nós
adquirimos é uma informação do fenômeno, mas não do objeto em si. O mundo real,
Kant chamou de mundo noumenal, enquanto o que nós experimentamos a partir de
nossa razão é o mundo fenomenal. Como nossa experiência é necessária antes de
racionalizarmos o fenômeno, coisas como Deus, a imortalidade da alma e outras
realidades metafísicas não podem ser
atingidas pela razão.
Claramente, se esse fosse todo o
argumento de Kant, teríamos que admitir que sua posição é auto-refutável. Pois
a idéia de que nós devemos ter a experiência empírica antes do racional em si não
passa pela experiência empírica. Foi por isso que ele utilizou da razão prática para “colocar” a metafísica
onde ela pertence.
Mas ainda há outro sentido em que
tal afirmação de Kant pode ser dita como auto-refutável. A afirmação “não
podemos conhecer o mundo real” é em si uma afirmação sobre o mundo real a qual
Kant conhece. De fato, tal visão comete a falácia do nada mais. Como disse Norman Geisler, é como se colocássemos um
papel branco em uma mesa preta. A única forma de dizer o que há depois do papel
é conhecendo o que esta depois dos limites dele. Da mesma forma, se dissermos
que não podemos saber nada mais do
que o que percebemos, dizemos que sabemos mais
do que os limites da percepção [15]. Geisler diz:
Dizer que
alguém não pode saber mais que os limites do fenômeno ou da aparência é como
tentar fazer uma linha na areia com as duas pernas. Estabelecer limites tão
firmes equivale a ultrapassá-los. Não é possível afirmar que a aparência
termina aqui e a realidade começa ali a não ser que se possa ver até certa
distância do outro lado. Como alguém pode saber a diferença entre aparência e
realidade se não viu o suficiente da aparência e da realidade para fazer a
comparação? [16]
Seriam os argumentos cosmológico e teleológico dependentes do ontológico?
Kant acreditava que os argumentos
cosmológico e teleológico são dependentes do ontológico, pois, de acordo ele,
assim como o ontológico, os argumentos vão da possibilidade da existência de
Deus para a existência necessária. Porém, nenhum dos argumentos pressupõem essa
possibilidade de existência necessária. De fato, é estranho dizer que eles
dependem do ontológico, já que eles existiram séculos antes dele. Ambos os
argumentos vão de efeito para causa:
Cosmológico: Natureza tem um inicio -> causa sobrenatural
Teleológico: O universo foi projetado -> houve um projetista
Ontológico: Deus existe é uma verdade necessária
Notou a diferença?
Uma critica à tudo?
Se fossemos obrigados a
considerar a objeção de Kant à teologia natural, teríamos que aplicá-la a tudo.
Pense nisso: Se não podemos conhecer a Deus porque existem argumentos pró e
contra, então até mesmo discussões políticas, éticas e de qualquer coisa teriam
que ser descartadas. Se a origem do universo não pode ser postulada porque
existem bons argumentos para a origem, mas bons contra a origem, então o mesmo
vale para outras coisas também. O conservadorismo não pode ser postulado como
melhor, pois existem bons argumentos a favor e contra. Ética deontológica ou
utilitarista não pode ser vista como uma visão ética melhor do que a outra,
pois ambas possuem bons argumentos a favor e contra. No fim, Kant apenas
atestou o óbvio: Há bons argumentos pro sim
e bons argumentos pro não. Mas é o
peso dos argumentos e sua verdade que implicam sua validade.
Pode ser respondido que, como a existência de Deus é algo que envolve a puramente a razão voltada à realidades metafisicas, então não podemos aplicar o mesmo principio à coisas práticas. Porém, coisas como o aborto e a politica envolvem algo ainda mais difícil de ser argumentado do que realidades metafísicas. Seria impossível - pra não dizer, tolo - um ser humano tentar argumentar para a certeza de um futuro contingente. Não sabemos se o bebê assassinado será um problema pra mãe (o que, de qualquer forma, não justificaria) ou se ele será um cientista que vai curar o câncer. Talvez seja respondido que nós podemos nos basear no agora para calcular a probabilidade de eventos futuros, mas isso apenas prova meu ponto: Podemos calcular a probabilidade de um argumento que se baseia em informações empíricas ou racionais e vemos quais argumentos, pró ou contra a existência de Deus, são mais poderosos.
Pode ser respondido que, como a existência de Deus é algo que envolve a puramente a razão voltada à realidades metafisicas, então não podemos aplicar o mesmo principio à coisas práticas. Porém, coisas como o aborto e a politica envolvem algo ainda mais difícil de ser argumentado do que realidades metafísicas. Seria impossível - pra não dizer, tolo - um ser humano tentar argumentar para a certeza de um futuro contingente. Não sabemos se o bebê assassinado será um problema pra mãe (o que, de qualquer forma, não justificaria) ou se ele será um cientista que vai curar o câncer. Talvez seja respondido que nós podemos nos basear no agora para calcular a probabilidade de eventos futuros, mas isso apenas prova meu ponto: Podemos calcular a probabilidade de um argumento que se baseia em informações empíricas ou racionais e vemos quais argumentos, pró ou contra a existência de Deus, são mais poderosos.
Conclusão
A objeção de Kant ao argumento cosmológico na verdade nos ajuda a entender a natureza da primeira causa, de modo que o argumento fica até mais forte. Quanto ao argumento teleológico, tudo o que Kant fez foi apontar a conclusão do argumento, o que é irrelevante. O argumento nunca foi intencionado a provar o Deus da Bíblia, mas sim um Deus compatível com o Deus da Bíblia. A critica mais famosa de Kant, que foi ao argumento ontológico, se mostrou como um espantalho e, mesmo se tivesse acertado, não seria conclusivo. Por fim, a síntese do empirismo com o racionalismo de Kant se mostrou auto-refutável, pois se não podemos conhecer o mundo real, como pode ele fazer tal afirmação sobre o mundo real? Como pode ele impor os limites sem saber o que esta além dos limites? Como ele sabe o que é, dizendo que não podemos saber o que é?
Fontes
[1] – KANT, Immanuel, Critica da razão pura, 5ª Ed. Fundação
Calouste Gulbenkian, A 427 B 455, p. 418
[2] – HAWKING, Stephen,
PENROSE, Roger, The nature of space and
time. Princeton University Press, 1996, p. 20
[3] – “The uncaused beginning
of the Universe”, em CRAIG, William Lane, SMITH, Quentin, Theism, atheism and
big bang cosmology, Oxford: Clarendon, 1993, p. 120
[4] – Citado por J. Warner
Wallace, em Can Multiverse Theories
Explain the Appearance of Fine Tuning in the Universe?, http://coldcasechristianity.com/2015/can-multiverse-theories-explain-the-appearance-of-fine-tuning-in-the-universe/
[5] – Inference Review, The Beginning of the universe, http://inference-review.com/article/the-beginning-of-the-universe
[6] – CRAIG, William Lane, The kalãm cosmological argument, 1ª Ed.,
The Macmillan Press, 1979, p. 151
[7] – Kant, ibid, A 627 B 655,
p. 534
[8] – TALIAFERRO, Charles, “The
Project of Natural Theology”, em The
blackwell companion to natural theology, ed. CRAIG, William Lane, MORELAND,
J. P., Wiley-Blackwell, 2009, p. 18.
[9] – Reasonable Faith, O
neoateísmo e cinco argumentos a favor de Deus,
http://www.reasonablefaith.org/portuguese/o-neoateismo-e-cinco-argumentos-a-favor-de-deus#ixzz4SGtvPw00
[10] – Kant, ibid, A 600 B
628, p. 517
[11] – Stephen T. Davis, God,
reason and theistic proofs, Edinburgh University Press, 1997, p. 35
[12] – PLANTINGA, Alvin, Deus, a liberdade e o mal, Vida Nova,
2012, pp. 123-124. Um pequeno erro de tradução foi corrigido para a melhor
compreensão.
[13] – _____, God and other minds: A study of the rational justification of belief in
God, Cornell University Press, 1975, p. 36
[14] – SPROUL, R. C., Defendendo sua fé: uma introdução à
apologética, CPAD, 2007, p. 134
[15] – GEISLER, Norman, TUREK, Frank, Não tenho fé suficiente para ser ateu, Vida.
[15] – GEISLER, Norman, TUREK, Frank, Não tenho fé suficiente para ser ateu, Vida.
[16] – _____, Enciclopédia de apologética: Repostas aos críticos
da fé cristã, Vida, 2002, p. 18
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