quarta-feira, 22 de julho de 2020

Uma pausa na apologética e conselhos aos novos apologistas.


Você deve ter notado que não há nenhum texto novo no blog e que alguns (muitos) textos antigos sumiram. O texto a seguir explicará parcialmente o porquê disso ter acontecido e logo em seguida irei para um conselho aos novos apologistas.
No último ano eu dei uma pausa nos posts porque, embora eu tivesse conhecimento para ser repassado, estava cansado de escrever apenas para um blog. Por mais que tenha seu valor o ensino passado por meio de blog posts, eu estava cansado (e ainda estou). Mas esse não é o ponto principal. Ano passado foi o ano em que eu mais estudei filosofia na vida: mais do que em qualquer ano do meu curso de filosofia. Digo isso sem medo de errar na precisão.
No ano passado eu comecei um projeto de pesquisa sobre Tomás de Aquino e os árabes da Idade Média (falsafa e kalam), e quais são as divergências e convergências dos pensamentos desses últimos com as ideias de Tomás. Claro, tal tarefa me levou de volta a Aristóteles, mas eu fui ainda além e comecei com Platão. Nesse último ano, eu percebi algo em mim que não iria aprender nunca se ficasse apenas na apologética: o valor da filosofia para superar a própria apologética.
Nesse ponto, não quero que entendam mal, por isso serei mais preciso no que quero dizer. Em 2013, quando comecei a estudar apologética por meio do trabalho do filósofo William Lane Craig, eu fiquei fascinado. É claro que, como doutor em filosofia, a apologética do Craig envolvia muitos aspectos profundamente filosóficos. Logo em seguida fui para Norman Geisler e continuei seguindo os estudos em apologética. Mas aqui está o ponto principal: eu estudava apenas os contemporâneos e acabava conhecendo um certo nível de filosofia por tabela.
Craig é profundamente filosófico. Por mais que ele tenha uma formação em teologia, é nítido que sua metodologia é primariamente filosófica. E ele é um grande filósofo. Na verdade, eu teria que ser muito autocentrado e/ou ignorante para olhar pra toda obra do Craig e dizer que ele não é um bom filósofo. Entretanto, ficar “preso” na obra apologética dele (e nele mesmo) é uma barreira para o crescimento.
Assim como os pressuposicionalistas ficam presos em Cornelius Van Til e Herman Dooyeweerd, muitos apologistas atuais ficam presos em nomes como Craig, Geisler, Ravi Zacarias e outros (ouso dizer, sem medo de errar, que Craig deixa Van Til no chinelo). E, embora exista um conteúdo muito bom nesses autores, é preciso ir além deles. E o apologista só vai além quando começar a estudar filosofia de verdade, fora da “bolha apologética”.
A “bolha apologética” é quando você lê Não tenho fé suficiente para ser ateu e, como meu amigo Gilberto ex-Cristão Contemporâneo gosta de dizer, acha que Geisler refutou Kant, Hume e todos os desafios modernos à fé cristã. É também quando o pressuposicionalista acha que pode resolver qualquer problema perguntando “de acordo com que padrão?” para o ateu. Usarei isso como exemplo para demonstrar porque estão errados. Imagine o diálogo:
Pessoa A: “Cristãos são imorais.”
Pressuposicionalista: “De acordo com que padrão você julga que eles são imorais?”
Pessoa A: “De acordo com formas platônicas existentes além do espaço-tempo que fundamentam os meus julgamentos morais.”
E agora? É realmente perguntar de acordo com qual padrão? Existem respostas para a alternativa da Pessoa A? Claro que existem. Mas você tem que ir além disso. Outro exemplo (continuando com o pressuposicionalismo por causa do ranço) é a questão do Uno e do Múltiplo. “Apenas a Trindade fornece uma resposta ao problema do Uno e do Múltiplo!” – Sério? Platão, Aristóteles e outros nunca buscaram solucionar o problema?
Por conta dessas limitações que a bolha apologética implica que senti que era necessário fazer uma pausa na apologética e estudar mais de filosofia. A filosofia é uma arma essencial para qualquer sistema apologético, mas você vai ficar extremamente preso se ficar apenas em Craig, Geisler e Van Til. Eles não respondem a tudo e nem tiveram a pretensão de fazê-lo. Na verdade, nem a Bíblia responde a tudo, gostando ou não disso. E quando eu falo de estudar filosofia, não é decorar o antes e depois da linha do desespero do Francis Schaffer, entender um pouco de Dooyeweerd e achar que está manjando dos paranauê tudo.
O que a pausa na apologética contribuiu para a minha apologética? Eu adquiri mais conhecimento sobre Platão, Aristóteles, Al-Kindi, Al-Ghazali, Avicena, Averróis e Tomás de Aquino que jamais pensei que iria adquirir. E todos estes citados têm algo útil para a apologética cristã. Ademais, vi que Craig, apesar de ter ressurgido com o argumento kalam não é o único defensor dele hoje. Existem filósofos que vão muito mais além do que ele. Filósofos como Andrew Loke, Joshua Rasmussen e Robert Koons são defensores de versões mais atualizadas do argumento kalam. Em suas versões, boa parte das objeções tradicionais são inúteis (objeções baseadas em teorias do tempo, por exemplo).
Outra coisa que percebi é que neo-ateísmo é o movimento mais burro que a internet já viu. Mas isso não significa que não existam bons filósofos ateus. Neo-ateísmo, como aquele predominante na mente de todos os comentários de ateus deste blog, é uma piada intelectual. (Pelo amor de Deus: um dos memes dos neo-ateus diz que Jesus mandou levar pessoas à sua frente e matá-las. Eu apontei em um texto que isso era dito por uma personagem em uma parábola e o indivíduo vem me dizer que eu “inventei a desculpa de que era uma parábola”, quando a própria Bíblia diz: “E Jesus lhes propôs uma parábola”)
Mas quando falamos de ateus sérios (e, aqui, não me refiro a Richard Dawkins, Daniel Dennett, Sam Harris, Stephen Hawking e Lawrence Krauss) vemos um desafio muito maior. Não que eles tenham refutado o cristianismo, longe disso. Mas podemos dizer, de forma análoga, que, enquanto você refuta todos esses neo-ateus citados acima lendo Em Guarda, para responder em pé de igualdade os ateus sérios você tem que começar com no mínimo Filosofia e cosmovisão cristã.
Eu não escrevi esse texto com muito ânimo, até porque eu nem queria postar nada. Mas achei preciso para dar um conselho ao leitor: estude. Estude filosofia além da apologética; estude história além da defesa da ressurreição de Jesus; estude crítica textual além de Sean McDowell; estude teologia além dos apologistas contra-seitas brasileiros (que são bem meia boca); e pelo amor de tudo que há de mais sagrado, estude ciência e exegese além de Adauto Lourenço. Lembre-se:
- Geisler tem seu valor, mas é apenas uma porta de entrada.
- Craig é excelente, mas estudar filosofia o ajudará a superar desafios maiores.
- Perguntar apenas “de acordo com qual padrão?” é preguiça intelectual.
- Existem ateus inteligentes, mas atualmente na internet  você não encontrará muitos.
- O mundo acadêmico precisa de mais intelectuais cristãos. Venha!
Ah! Os textos que foram retirados não voltarão por um tempo. Eu os retirei porque: (a) achei que estavam bem mal escritos; (b) eu não concordava tanto com alguns, e (c) eu fiquei mais criterioso com ABNT e essas normas chatas.
Que Deus os abençoe,

Felipe S. Forti.