segunda-feira, 29 de maio de 2017

P&R #4 - Adão nomeando os animais

http://www.holyhome.nl/bvib-09.html

Pergunta


Olá, primeiramente gostaria de parabenizar pelo conteúdo do blog, muito bom mesmo!
Tenho uma pergunta que possivelmente coloca em cheque o ponto de Adão não ter tempo para nomear todos os animais no sexto dia: Era realmente necessário nomear todos os tipos de animais e "almas viventes" citados em Genesis 2 v19 e v20 ? Porque partindo do ponto de vista do autor de Gênesis seria consistente pensar que não eram muitos animais, uma vez que os judeus provavelmente conheciam poucas espécies, assim do ponto de vista do autor do texto me parece coerente pensar que Adão teve tempo suficiente pra dar o nome de todas as espécies conhecidas pelos judeus.
Também gostaria de pedir indicações de material defendendo diluvio local (livros que defendam essa posição de maneira biblica).
E outra pergunta, apesar de já ter visto argumentos para crer que Êxodo 20 v10 e 11 não defendem os dias de Gênesis 1 como sendo literais, você ainda se sente inseguro com a abordagem biblica "old earth"?
Agradeceria de coração uma resposta, sou simpático ao criacionismo progressista mas ainda me sinto inseguro na questão, se puder indicar livros e vídeos falando a respeito do tema ficaria muito mas MUITO grato mesmo, abraços!

Atenciosamente,
Jessé de Souza Martins da Silva

Resposta


Eu não acho, Jessé, que seja relevante quantos animais o autor de Gênesis conhecia. O simples fato dele nomear os tipos de animais que seriam nomeados já abrange todos os que haviam sido criados anteriormente. O contexto de criação, antes de Adão ter de nomear os animais, implica que Adão, na verdade, nomeou todos os animais criados antes, não apenas os que o autor de Gênesis conhecia.
O texto de Gênesis 2 diz:

Havendo, pois, o Senhor Deus formado da terra todo o animal do campo, e toda a ave dos céus, os trouxe a Adão, para este ver como lhes chamaria; e tudo o que Adão chamou a toda a alma vivente, isso foi o seu nome.
E Adão pôs os nomes a todo o gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo; mas para o homem não se achava ajudadora idônea.
Gênesis 2:19,20

Antes disso, o texto narra no versículo 19 que “o Senhor Deus formou da terra todo animal...” É importante ressaltar que o hebraico para “todo” é kol, que significa literalmente, todos. O contexto não da suporte à interpretação apresentada, pelo fato de seguir uma linha:
- Deus criou todo o universo
- Deus construiu tudo no universo
- Deus formou todos os animais
Não faria muito sentido Deus criar tudo e de repente apenas focar nos animais conhecidos pelo autor. Acredito que até mesmo Moisés sabia que havia muitos animais ele não conhecia!
Podemos mostrar outras partes da Bíblia em que o autor também não sabia o que estava se passando, mas narrou de sua maneira. Por exemplo, em Josué 10:13, o sol não parou literalmente, mas sim a terra que parou. Temos aqui a narrativa com o conhecimento do autor, mas esse conhecimento não abrange tudo o que aconteceu de fato. Do mesmo modo, mesmo se Moisés estivesse narrando com base nos animais que conhecia, ainda assim o texto não permite que esse conhecimento do autor abrangesse tudo o que aconteceu. De fato, isso não respeitaria o sentido óbvio do texto. Seria necessário uma pressuposição ad hoc e tentar encaixa-la no texto para que essa interpretação funcionasse, sendo assim uma eisegese, não exegese.
Com respeito a sua segunda pergunta, o que eu posso recomendar é o site godandscience.org e oldearth.org.
Já para a terceira, você diz “apesar de já ter visto argumentos para crer que Êxodo 20 v10 e 11 não defendem os dias de Gênesis 1 como sendo literais, você ainda se sente inseguro com a abordagem bíblica ‘old earth’?” De modo nenhum! Eu tenho plena certeza que a Bíblia em parte alguma ensina a criação recente. A criação recente, a meu ver, é biblicamente fantasiosa e cientificamente indefensível. A ciência de terra jovem depende muito da demonstração de que métodos de datação não funcionem. Também é altamente improvável que tudo o que sabemos nos ramos de geologia, cosmologia, física e biologia estejam errados. Quanto aos argumentos bíblicos, eles também parecem defeituosos. O que é algo que eu já argumentei bastante na série Criacionismo Progressivo, aqui do blog.
Livros que posso te recomendar sobre o assunto são:
- A Matter of Days, Hugh Ross
Espero que tenha ajudado!

Paz,

Felipe Forti

terça-feira, 23 de maio de 2017

Como pensar o problema do sofrimento


Como pensar o problema do sofrimento

Por: Caio Peclat da Silva Paula

ATENÇÃO: Neste post não fiz a distinção entre mal moral e mal físico. Não é um texto introdutório. Sugiro leitura deste texto aqui.
Se você estuda a arte do pensamento, perceberá que para responder uma pergunta complexa é necessário construir um sistema filosófico, uma estrutura de pensamento. Eu não sei se você já teve esta impressão, mas quando estudei o problema do sofrimento (pode ser conceituado como: “Por que um Deus bom e amoroso permitiria o sofrimento humano?”) conseguia encontrar algumas explicações, mas nada concreto, parecia que todas as tentativas de respostas (teodiceias) foram em vão. Neste contexto nasce a estrutura que John W. Wenham para, primeiro pensar, e depois responder o problema do sofrimento.
  • ·         Liberdade;

Este ponto é praticamente universal entre a maioria dos autores que já li. A liberdade é o que possibilita que a ação humana seja boa ou má. Assim, a natureza pecaminosa humana faz com que a ação a ser escolhida seja a má. Neste sentido, boa parte do mal que existe no mundo é causada primeiramente pelo pecado, e este pela liberdade do homem. Contudo, dessa vez, tenho que ir além de Wenham para demonstrar o motivo de possuirmos a liberdade.
Primeiramente note que se retirarmos a liberdade do homem, com certeza grande parte do mal não existiria. Entretanto, não seríamos livres. Se existe uma coisa que Deus valoriza muito é o relacionamento. E para que um relacionamento seja sincero é essencial que haja a escolha de relacionar-se. E para que uma escolha seja feita, necessário é, evidentemente, a existência da liberdade. Após esta leitura tenho certeza que você pode compreender perfeitamente que a liberdade é um ato de amor de Deus.
  • ·         Pecado;

Wenham também acredita que “o pecado seja relacionado ao sofrimento, sendo este um desestímulo”. Neste sentido, o mal seria tal como a dor de uma ferida. O mal (ou o sofrimento) avisaria que existe algo errado e que deve ser concertado. No caso a ferida deve ser tratada e deve-se tomar cuidado para não causar uma nova ferida, pois a dor é incômoda. Assim, sempre que alguém pensar em pecar lembrar-se-á do mal que o pecado traz.
  • ·         Nosso bem supremo através do sofrimento;

Lembro-me de um autor que dizia que tudo de grande nesta Terra se fez grande por ter passado pelo sofrimento. Neste sentido, o sofrimento é uma ponte para que se alcance a glória. É com este pensamento em mãos que Wenham diz que o que possuímos de mais precioso – a salvação – foi construído em meio à dor, horror e sofrimento na cruz. É assim que temos que lembrar que o sofrimento não é um obstáculo, mas um caminho para a grandeza.
  • ·         Não sabemos de tudo ainda;

“Quem é o homem para dar a impressão de que compreende a sabedoria infinita e a complexidade dos propósitos divinos?” – diz Wenham. O intelecto humano é limitado e não conhece todas as coisas. Portanto, não devemos questionar Deus por coisas que não sabemos. Deus pode ter um motivo muito especial para que exista o meu e o seu sofrimento, contudo, este motivo pode ser tão complexo que nem o mais inteligente de nós poderia entender. Se Deus nos respondesse a pergunta “Por que sofremos?”, neste pensamento, Ele diria algo parecido com isso: “Eu te responderei, mas na minha resposta irei falar de coisas que você ainda não conhece, como pessoas, leis da natureza e uma matemática muito complicada para você entender...”.
  • ·         O sofrimento pode estimular a vida espiritual;

É nítida a impressão, ao se ler a história de homens que andaram com Deus, de que ainda que o sofrimento seja doloroso, há algo de útil no mesmo. É impressionante a capacidade de o sofrimento tornar aquele que sofre um tanto mais sensível a dor do outro. Acredito que não seja necessário falar que esta não é a única característica que o sofrimento nos trás como um presente. Aquele que passa pelo sofrimento (geralmente) bebe do néctar das mais altas virtudes. O sofrimento nos leva para perto de Deus. Este é um fato que cada história bíblica (que envolve o sofrimento) nos apresenta como lição.
  • ·         Retribuição, Postergada e atinge a todos;

No Direito Penal brasileiro vigente, um dos fundamentos da pena é a retribuição. O criminoso comete a infração penal e o Estado retribui com a pena. Para o autor em questão, o sofrimento é a retribuição de Deus dá ao pecado humano. De modo análogo ocorre com uma ação boa a recompensa divina. Mas é interessante notar que esta retribuição é postergada, pois assim o pecador teria tempo para se arrepender e aquele que pratica o bem, mais uma oportunidade para aprofundar a sua fé. Necessário é ressaltar que, o sofrimento é estendido a todos por, a priori, dois motivos, são eles: Para que todos vejam o poder de Deus e sua justiça; e para que todos recebam a punição. Mas neste ponto você me pergunta: ”Todos devem receber a punição? E os inocentes?”. A melhor resposta é: “Não há inocentes”!
  • ·         Sofrimento é limitado;

Mesmo que nosso sofrimento pareça grande, ele ainda é limitado a esta vida. Evidentemente, o cristianismo não acredita que a vida terrena vale por si mesma. Ela vale pela oportunidade de salvação que ela nos dá. Salvação esta que leva o homem à vida Eterna. Nesta segunda vida não há sofrimento. Mas se pudermos observar sinceramente (e também de modo racional – digo, livre de sentimentalismo tóxico) é possível concordar, mesmo que em primeiro momento seja difícil, com as palavras do apóstolo Paulo:

“A nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2 Cor 4.17).

segunda-feira, 1 de maio de 2017

A repressão dos afetos

(https://bereianews.files.wordpress.com/2014/04/augustus-nicodemus.jpg?w=267&h=300)

Por Caio Peclat da Silva Paula

Não é tão raro ouvir que Freud copiou Nietzsche! Já existem alguns livros publicados que defendem esta tese. Eu, particularmente, não acredito que seja tão relevante assim esta discussão. Afinal, se Freud copiou, copiou com maestria. Entretanto este não será o tema do post de hoje. Falaremos sobre um tema que liga o pensamento destes dois grandes gênios. A repressão de afetos.
Leonardo Zoccaratto Ferreira em suas aulas na internet costuma explicar o pensamento Nietzscheano da seguinte forma: No mundo, ou somos afetados ou o afetamos. O som da televisão ligada neste momento em que escrevo me afeta. O pedido que fiz para abaixarem o volume do aparelho afetou quem o assistia. Quando algo (ou alguém) nos afeta, este afeto entra no corpo e necessita sair de alguma forma. Se não sair de uma, sai de outra (forma).
Assim, se algum homem sente desejo sexual, ele é afetado e necessita afetar o mundo com o seu desejo. Se o afeto é sexual, o desejo, logicamente, deverá ser sexual. Este também é o pensamento de Sigmund Freud.  E é precisamente sobre este tipo de afeto (o sexual) que ouviremos hoje. Digo “ouviremos”, pois a partir de agora a palavra está com o Dr. Augustus Nicodemus:


  • 1-

“Esse argumento parte do princípio de que os evangélicos conservadores são contra o sexo. Já desisti de tentar mostrar aos libertinos que essa ideia é uma representação falsa da visão cristã conservadora sobre o assunto. Nós não somos contra o sexo em si. Somos contra o sexo fora do casamento, pois entendemos que as relações sexuais devem ser desfrutadas somente por pessoas legitimamente casadas. Foi o próprio Deus que nos criou sexuados. E ele criou o sexo não somente para a procriação, mas como meio de comunhão, comunicação e prazer entre marido e mulher”. (NICODEMUS, Augustus. O ateísmo cristão e outras ameaças à Igreja — São Paulo: Mundo Cristão, 2011. p.95)

  • 2-
“O argumento de que reprimir o desejo sexual causa traumas, no fundo, acaba colocando a culpa em Deus, na Bíblia e na Igreja de serem uma fábrica de neuróticos reprimidos. Sim, pois a Bíblia ensina claramente a abstinência, a pureza sexual e a virgindade para os que não são casados, conforme argumentei no texto anterior, “Carta a um jovem evangélico que faz sexo com a namorada”. Se a abstinência sexual antes do casamento traz transtornos mentais e emocionais, deveríamos considerar esses ensinamentos da Bíblia como radicais, antiquados e inadequados, portanto como meras ideias humanas de pessoas que viveram numa época pré-Freud — e, como tais, deveriam ser rejeitadas e descartadas como palavra de homem, e não palavra de Deus. Ao fim, a contenção dos libertinos é mesmo contra a Bíblia e contra Deus”. (NICODEMUS, Augustus. O ateísmo cristão e outras ameaças à Igreja — São Paulo: Mundo Cristão, 2011. p.96)

  • 3-
“Bem, para esse argumento ser verdadeiro, teríamos de verificá-lo estatisticamente, na prática. Pesquisa alguma vai mostrar que existe uma relação direta de causa e efeito entre abstinência antes do casamento e distúrbios mentais, neuroses e coisas afins. Da mesma forma que nenhuma pesquisa vai mostrar que os jovens que praticam sexo livre antes do casamento são equilibrados, sensatos, sábios e inteligentes. Pode ser que até se prove o contrário. Os tarados, estupradores e maníacos sexuais não serão encontrados no grupo dos virgens e abstinentes. Talvez fosse interessante mencionar nesse contexto o estudo conduzido na Universidade de Minnesota por Ann Meier. De acordo com as pesquisas, o sexo estava associado à autoestima baixa e depressão em garotas que iniciaram as relações sexuais (entre os 15 e os 17 anos, em média) sem relacionamento afetivo ou romântico”. (NICODEMUS, Augustus. O ateísmo cristão e outras ameaças à Igreja — São Paulo: Mundo Cristão, 2011. p.96)

  • 4-
“Embora a decisão de preservar-se para o casamento vá provocar lutas e conflitos internos no coração e na mente dos jovens evangélicos, esses conflitos nada mais são que a luta normal que todo cristão verdadeiro enfrenta para viver uma vida reta e santa diante de Deus, mortificando o pecado e se revestindo diariamente de Cristo (Rm 3; Cl 3; Ef 4—5). Fugir das paixões da mocidade foi o mandamento de Paulo ao jovem Timóteo (2Tm 2:22). Esse combate contra a nossa natureza carnal não provoca traumas, neuroses, recalques e distúrbios. Ao contrário, nos ensina paciência, perseverança, a amar a pureza e a apreciar as virtudes, o que significa tomar diariamente a cruz, como Jesus nos mandou (Lc 9:23). Os que não querem tomar o caminho da cruz, entram pela porta larga e vivem para satisfazer seus desejos e instintos.
Por esses motivos acima e por outros que poderiam ser acrescentados, considero esse argumento — de que a abstenção das relações sexuais antes do casamento provoca complexos, neuroses, recalques — como nada mais que uma desculpa para aqueles que querem viver na fornicação. Não existe realmente substância e fundamento para essa ideia, a não ser o desejo de justificar-se diante de uma consciência culpada, da opinião contrária de outros ou dos ensinamentos das Escrituras”. (NICODEMUS, Augustus. O ateísmo cristão e outras ameaças à Igreja — São Paulo: Mundo Cristão, 2011. p.97)

Caio Peclat da Silva Paula