terça-feira, 10 de janeiro de 2017

P&R #3 - Os Discípulos de Jesus vs Homens-bomba

Pergunta:

Para dar um ponto positivo à ressurreição de Jesus e à veracidade do Cristianismo usamos às vezes o argumento de que "É altamente improvável ou quase impossível que os apóstolos tivessem morrido por uma invenção, uma mentira, um embuste, enfim." Até aí, tudo em ordem. Mas e se alguém objetasse dizendo: "Homens-bombas também morrem por causa de Deus, isso quer dizer que o islamismo também é verdade?", qual resposta eu poderia dar? Será que há alguma coisa a mais que eu não estou conseguindo enxergar nessa estória toda?
Obrigada, desde já.

Feliz Natal e tenha um próspero ano novo e que a paz de Cristo esteja com você.

Atenciosamente,
Yasmin.

Os Discípulos de Jesus vs Homens-bomba


Resposta:

Acredito que a questão fundamental acerca do assunto seja: Por que os discípulos mentiriam e morreriam por isso? Diferente de Homens-bomba, a o argumento é o de que os discípulos não poderiam estar dispostos a morrer por uma mentira que eles mesmos inventaram. No caso dos kamikaze, eles não tem a menor idéia de que sua crença é falsa. Mas eles creem nisso com convicção. Muçulmanos que se sacrificam pensam que estão fazendo a vontade de Allah e que ao chegar o céu haverão dezenas de virgens os esperando.
No caso da ressurreição nós temos a expectativa zero de um Messias que morreria e passaria por uma ressurreição isolada como a de Jesus. Dado o fato de que 100% dos historiadores creem que Jesus foi crucificado[1], fica a incógnita do porque os discípulos se sacrificariam para espalhar um Messias ressurreto tão contrário à expectativa judaica. Como explica William Lane Craig:

Mesmo os mais céticos estudiosos do Novo Testamento admitem que os primeiros discípulos pelo menos criam que Jesus havia ressuscitado. Na verdade, eles depositavam toda a fé nesse fato. Observemos apenas um exemplo: a convicção de que Jesus era o Messias. [...]
Suponha-se que o Messias seria uma figura triunfante que evocaria o respeito tanto dos judeus quanto dos gentios e que estabeleceria o trono de Davi em Jerusalém. Um Messias que não liberou e não reinou, que foi derrotado e humilhado e morto pelos seus inimigos é uma contradição em si. Em nenhum lugar os textos judaicos falam de um “Messias” assim. [...] Portanto, quase não da pra descrever o desastre que a crucificação representou para a fé dos discípulos. A morte de Jesus na cruz punha um fim humilhante a todas as esperanças que eles haviam nutrido sobre ele como o Messias.[2]

Portanto, não creio que seja uma questão de simplesmente “morrer por uma mentira.” Mas sim morrer sabendo que é mentira. Os discípulos, como Judeus, não iria criar a história da ressurreição do Messias e colocar suas vidas em jogo. Na verdade, seria até mesmo difícil alguém convencer um judeu da época sem uma evidência convincente, como testemunhas oculares do Cristo ressurreto.[3] Já homens-bomba agem puramente por fideísmo.

Felipe.


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[1] Na verdade, esse ponto é indiscutível entre historiadores. Historiador Luke Johnson diz: “A evidência para o modo de sua morte, seus agentes, e talvez coagentes, é esmagadora: Jesus encarou julgamento antes de sua morte, foi condenado e executado por crucificação.” (Luke Timothy Johnson, The Real Jesus, p. 125) A historiadora Paula Frederickson diz: “A crucificação é o fato particular mais forte que temos sobre Jesus.” (Paula Frederickson, observação durante uma discução na sessão “The Historical Jesus” no encontro anual da Society of Biblical Literature, 22 de Novembro de 1999) Até mesmo o radical John Dominic Crossan diz: “Que ele [Jesus] foi crucificado é tão certo quanto qualquer coisa histórica pode ser.” (John Dominic Crossan, Jesus: A Revolutionary Biography, p. 145)
[2] William Lane Craig, Apologética contemporânea: a veracidade da fé cristã, 2ª Ed., Vida Nova, São Paulo, p. 371
[3] O argumento da origem do Cristianismo como evidência da ressurreição de Cristo foi bem explorado no magnífico livro do historiador N. T. Wright, A ressurreição do filho de Deus, Editora Paulus, 2013

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