Ciência e Religião são inimigos mortais? Nunca se deram bem? Será que para ser Cristão você deve abandonar toda e qualquer ciência? Será que estes dois podem se relacionar? Qualquer cientista racional é naturalista?
Ciência V.S. Religião?
Em seu livro “Where the Conflict Really Lies – Science, Religion and Naturalism” [Onde se encontra o real conflito – Ciência, religião e naturalismo], o filosofo americano Alvin Plantinga tenta demonstrar como, de diversas maneiras, a ciência e a religião podem estar relacionadas. Na verdade, ao longo do livro, Plantinga mostra como alguns detalhes da física suportam a religião e mostra porque não há conflito entre a evolução e o cristianismo.
O mito de que existe uma
contradição entre ciência e religião é parcialmente novo. Por exemplo, os
conflitos aparentes das descobertas biológicas, diz Plantinga, não são
“verdadeiros conflitos”. Ele tenta nos mostrar como, na verdade, a evolução se
encontra em conflito com o naturalismo.
Não podemos dizer que o
cristianismo é inimigo da ciência, quando vemos que no passado foi um dos
principais motivos para o crescimento da ciência no oeste. Historiadores dizem
que as religiões pagãs acreditavam em diversos mistérios sobrenaturais, deuses
naturais, fadas e outros seres místicos. Por contraste, aqueles que seguiam os
valores judaico-cristãos viam o mundo de forma que tivesse sido feito por um
designer cósmico. Por exemplo, enquanto pagãos acreditavam que o sol era um deus,
os cristãos o viam como uma “lâmpada” que seguia a lei de um Legislador. Para
os Cristãos, tudo seguia essa lei natural dada por um Legislador. Jerry
Newcombe expressa dessa maneira:
“Todo o principal ramo da ciência que foi criada foi originado por pessoas que acreditavam na Bíblia. Eles acreditavam que estavam, nas palavras de Johannes Kepler, pensando os pensamentos de Deus, atrás dele” [1]
E.O. Wilson pergunta, por que a
ciência não cresceu na China? Eles tem bem mais tecnologia que a Europa. Wilson concluiu:
“De provavelmente ainda maior importância, estudiosos Chineses abandonaram a idéia de um ser supremo com propriedades pessoais e criativas. Nenhum Autor da Natureza Racional existiu em seu universo; consequentemente, os objetos que eles meticulosamente descreviam não seguiam princípios universais, mas ao invés disso operavam por dentro de uma regra particular seguido por essas entidades em ordem cósmica. Na ausência de necessidade imperiosa para a noção de lei geral – pensamentos na mente de Deus, por assim dizer – pequenas ou nenhuma pesquisa era feita por eles.” [2]
Muitos dos grandes cientistas do
passado eram Teistas e levavam a Biblia seriamente. Cientistas como Kepler,
Pascal, Boyle, Newton, Linnaeus, Faraday, Cuvier, Kelvin, Lister, Mendel e
vários outros. Podemos citar vários outros atuais, como Aron Wall, Rodney
Holder, Stephen Barr, Alister McGrath, Michael Behe, Stephen Meyer dentre
outros. Mas citar nomes não é o bastante. Os chamados “novos ateus” querem
mesmo que haja um verdadeiro conflito entre a ciência e a religião. Na verdade,
mesmo se listasse mais de 500 cientistas com PhD que são religiosos, eles
diriam que esses cientistas “não valem e são burros”. Richard Dawkins, por
exemplo, disse que cientistas que não acreditam na teoria da evolução são
“burros”. Assim como Plantinga e outros, eu também não vejo conflito entre
evolução e criação, mas aqueles que são proponentes do Design Inteligente
dificilmente podem ser chamados de “burros” por verem limites na teoria da
evolução.
Na verdade, uma pesquisa feita
pelo Pew Research Center em 2009 revelou que apenas 17% dos cientistas são
ateus, 11% agnósticos e 20% não tem “posição nenhuma em particular”. Já para o
lado teista, 16% são protestantes, 10% católicos, 8% judeus, 4% evangélicos e
10% “outras religiões” (4% recusaram responder ou não sabem em que posição
ficam). [3]
A Ciência é Onipotente?
Já que Deus não pode ser provado
pela ciência, os pseudo-intelectuais resolveram mostrar que há, de fato, um
conflito entre ciência e religião. Essa visão vem de uma forma de cientificismo
de extrema mente fechada.
O cientificismo diz que a única
fonte da verdade é a ciência. Tudo o que não esta de acordo com a ciência
moderna é falso e irracional.
O chamado “cientificismo forte” afirma que alguma coisa só pode ser
verdadeira se, e somente se, essa coisa for uma teoria ou proposição
cientifica. Não há verdades alem das cientificamente provadas e se houver não
há motivos para se crer nelas.
O “cientificismo fraco” diz que existem coisas fora da ciência que
podem ser provadas, mas a ciência é a forma de conhecimento superior a todas as
outras. Alem disso, diz que não há limites para a ciência.
Se pensarmos bem, vemos que essas
visões possuem diversos problemas. Considere primeiro a afirmação do
“cientificismo forte”, que diz que só devemos acreditar em coisas que são
cientificamente provadas. A afirmação “só devemos crer naquilo é pode ser
cientificamente provado” não pode ser cientificamente provada. Portanto, é
falsa em si mesma.
Há outros problemas também com o
cientificismo em geral. Primeiro, ele não permite a atividade de aceitar e
defender pressuposições cientificas necessárias para que a ciência seja
praticada, tornando o cientificismo um inimigo da ciência. Segundo, há diversas
coisas que não podem ser provadas cientificamente mas são racionais de se crer:
- Verdades éticas: A ciência não
pode nos dizer o que é certo e errado ou o que é bom ou mal. Você não pode
fazer um experimento para ver se os nazistas estavam errados ou não.
- Verdades Matemáticas e lógicas:
A ciência pressupõe a matemática e a lógica, portanto tentar prova-las por
métodos científicos seria argumentar em círculos.
- Verdades metafísicas: A ciência
não pode provar verdades metafísicas como a crença de que existe um mundo
externo, que existem outras mentes alem da minha, que o passado não foi criado
a cinco minutos com aparência de antigo, etc.
- Julgamentos estéticos não podem
ser explicados cientificamente.
Esses são alguns exemplos de
coisas que não podem ser explicados cientificamente.
Ciência e Teologia - Como podem se relacionar?
No livro “Filosofia e Cosmovisão Cristã”, William Lane Craig e J. P.
Moreland listam seis modelo para integrar a ciência e a teologia:
1- A ciência e a teologia agem em duas áreas diferentes, a natural e
a sobrenatural.
Esse modelo diz respeito a certas
áreas da teologia e da ciência, como debates sobre a natureza de anjos ou
debates sobre a estrutura de moléculas que se concentram em áreas distintas.
2- A ciência e a teologia compreendem duas abordagens diferentes e
complementares, alem de descrições da realidade de pontos de vista diferentes.
A ciência e a teologia apenas entram em conflito se uma área invade ilegalmente
a outra.
Essa área trata da distinção
entre causa primaria e causa secundaria. Por exemplo, o que
Deus fez no mar vermelho foi uma causa
primaria e o que ele fez para sustentar e direcionar o mar do milagre antes
e depois do milagre foi causa secundaria.
Causas secundarias são os métodos
naturais de Deus operar. Causas primarias são o método incomum de intervenção
divina.
3 - A ciência pode preencher detalhes da teologia ou auxiliar na
aplicação dos princípios teológicos, e vice-versa.
O modelo 3 é bem direto. Por
exemplo, a afirmação teológica de que não devemos deixar nossos filhos irados,
e a psicologia pode dar detalhes importantes e praticas dessa afirmação sobre a
causa de uma ira em personalidades diferentes.
4- A teologia concede a fundamentação epistemológica e metafísica
para a ciência ao justifica ou, pelo menos, ajudar a justificar as
pressuposições necessárias da ciência.
Esse modelo propõe que muitas
pressuposições cientificas estão a vontade com a fé cristã. Mas outras que não
tem justificativa e são apenas baseadas em uma visão naturalista. Desse modo, o
teismo cristão não é apenas consistente com essas pressuposições, mas também a
melhor explicação para elas.
5- A ciência nos mostra os limites das operações teológicas. A
teologia só pode entrar em ação após consultar a ciência. A ciência pode
advertir a teologia, mas não o contrario.
De acordo com essa visão, se
existem duas interpretações diferentes de pontos de vista teológicos, então a
que estiver mais de acordo com a ciência é a preferível. Por exemplo, passagens
que dizem que a Terra tem 4 lados não devem ser entendida ao pé da letra.
6- A ciência e a teologia entendem descrições que podem interagir
uma com a outra de formas mutuamente encorajadoras e concorrentes.
Essa é a chamada ciência teista.
De acordo com essa visão, a ciência e a teologia podem interagir de forma
direta entre si. Algumas proposições teológicas podem apoiar ou ganhar apoio da
ciência. Por exemplo, a teologia nos disse que o universo teve um inicio e
cientificamente isso se tornou mais provável de ser verdadeiro do que falso. [4]
O principal conflito na visão 6 é
o debate criação-evolução. A palavra “evolução” tem diversos significados, mas
uma forma indiscutível o de que há “mudança através do tempo”. Esse
significado, chamado de microevolução, apenas diz que um organismo pode mudar
de varias formas dentro de alguns limites. O segundo sentido é o de que todas
as espécies vem de um ancestral comum. Essa é chamada de macroevolução.
Existem três grupos que debatem
nessa área:
1- Os Criacionistas de Terra
Jovem: Acreditam que o universo tem no maximo 20 mil anos, que a criação foi em
6 dias consecutivos de 24 horas. Eles também crêem que o dilúvio de Noé foi
global.
2- Os Criacionistas de Terra
Antiga: Estes não aceitam o entendimento literal de Gênesis, mas acreditam (e
mostram evidencias cientificas e bíblicas) que Deus trabalhou continuamente
durante varias eras. (Se quiser tomar essa posição,
recomendo o site Reasons to Believe)
3- Evolucionistas
Teistas/Criacionistas Evolucionistas: Eles acreditam que a ciência e a teologia
são complementares e mostram biblicamente que a evolução não é incompatível com
Gênesis. (Se quiser
um site de cientistas e teólogos com essa posição, recomendo o BioLogos)
A ciência teista diz que quando
cristãos se envolvem em áreas intelectuais como a ciência, eles devem
considerar tudo o que possa ser relevante para aquilo, e crenças teológicas
devem ser consideradas.
A teologia pode fornecer
proposições para orientar a pesquisa (Por exemplo, pode-se considerar que os
modelos de universo com o passado infinito são falsos)
A teologia pode ajudar a resolver
problemas conceituais internos e externos (Como os problemas da improbabilidade
do surgimento da vida)
A teologia pode esclarecer
problemas quanto a hipóteses cientificas (como se considerarmos que Deus foi a
causa primaria para criar o homem) [5]
Conclusão
A meu ver não há conflito entre a
ciência e a teologia. Muitos cientistas do passado andaram junto com a religião
em sua carreira e a ciência não pode explicar tudo. Chamar cientistas com PhD
de “burros” e “não científicos” só por que são teistas é tão idiota quanto
dizer que 2+2=5. Também vimos que há métodos de relação entre a ciência e a
teologia e que existem cristãos que aceitam a evolução (e isso será tópico de
outro texto também).
Ciência e religião não são
inimigos. Nas palavras de John Lennox, “podemos
entender completamente como uma maquina funciona, mas isso não quer dizer que o
engenheiro não exista”.
Fontes
[1] – What if Jesus Had Never Been Born? – https://www.youtube.com/watch?v=uHLioeL9dYk
(28:28)
[2] – E. O. Wilson, “Consilience: The Unity of
Knowledge”, p. 31
[3] – Pew Research Religion & Public Life
Project – Scientists and Beliefs - http://www.pewforum.org/2009/11/05/scientists-and-belief/
[4] – William Lane Craig e J. P.
Moreland, “Filosofia e Cosmovisão Cristã”, p. 433-434
[5] – Idem. p. 438-439
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