sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Ciência e Religião - Há conflitos reais?


Ciência e Religião são inimigos mortais? Nunca se deram bem? Será que para ser Cristão você deve abandonar toda e qualquer ciência? Será que estes dois podem se relacionar? Qualquer cientista racional é naturalista?

Ciência V.S. Religião?


Em seu livro “Where the Conflict Really Lies – Science, Religion and Naturalism” [Onde se encontra o real conflito – Ciência, religião e naturalismo], o filosofo americano Alvin Plantinga tenta demonstrar como, de diversas maneiras, a ciência e a religião podem estar relacionadas. Na verdade, ao longo do livro, Plantinga mostra como alguns detalhes da física suportam a religião e mostra porque não há conflito entre a evolução e o cristianismo.
O mito de que existe uma contradição entre ciência e religião é parcialmente novo. Por exemplo, os conflitos aparentes das descobertas biológicas, diz Plantinga, não são “verdadeiros conflitos”. Ele tenta nos mostrar como, na verdade, a evolução se encontra em conflito com o naturalismo.
Não podemos dizer que o cristianismo é inimigo da ciência, quando vemos que no passado foi um dos principais motivos para o crescimento da ciência no oeste. Historiadores dizem que as religiões pagãs acreditavam em diversos mistérios sobrenaturais, deuses naturais, fadas e outros seres místicos. Por contraste, aqueles que seguiam os valores judaico-cristãos viam o mundo de forma que tivesse sido feito por um designer cósmico. Por exemplo, enquanto pagãos acreditavam que o sol era um deus, os cristãos o viam como uma “lâmpada” que seguia a lei de um Legislador. Para os Cristãos, tudo seguia essa lei natural dada por um Legislador. Jerry Newcombe expressa dessa maneira:

“Todo o principal ramo da ciência que foi criada foi originado por pessoas que acreditavam na Bíblia. Eles acreditavam que estavam, nas palavras de Johannes Kepler, pensando os pensamentos de Deus, atrás dele” [1]

E.O. Wilson pergunta, por que a ciência não cresceu na China? Eles tem bem mais tecnologia que a Europa. Wilson concluiu:

“De provavelmente ainda maior importância, estudiosos Chineses abandonaram a idéia de um ser supremo com propriedades pessoais e criativas. Nenhum Autor da Natureza Racional existiu em seu universo; consequentemente, os objetos que eles meticulosamente descreviam não seguiam princípios universais, mas ao invés disso operavam por dentro de uma regra particular seguido por essas entidades em ordem cósmica. Na ausência de necessidade imperiosa para a noção de lei geral – pensamentos na mente de Deus, por assim dizer – pequenas ou nenhuma pesquisa era feita por eles.” [2]

Muitos dos grandes cientistas do passado eram Teistas e levavam a Biblia seriamente. Cientistas como Kepler, Pascal, Boyle, Newton, Linnaeus, Faraday, Cuvier, Kelvin, Lister, Mendel e vários outros. Podemos citar vários outros atuais, como Aron Wall, Rodney Holder, Stephen Barr, Alister McGrath, Michael Behe, Stephen Meyer dentre outros. Mas citar nomes não é o bastante. Os chamados “novos ateus” querem mesmo que haja um verdadeiro conflito entre a ciência e a religião. Na verdade, mesmo se listasse mais de 500 cientistas com PhD que são religiosos, eles diriam que esses cientistas “não valem e são burros”. Richard Dawkins, por exemplo, disse que cientistas que não acreditam na teoria da evolução são “burros”. Assim como Plantinga e outros, eu também não vejo conflito entre evolução e criação, mas aqueles que são proponentes do Design Inteligente dificilmente podem ser chamados de “burros” por verem limites na teoria da evolução.
Na verdade, uma pesquisa feita pelo Pew Research Center em 2009 revelou que apenas 17% dos cientistas são ateus, 11% agnósticos e 20% não tem “posição nenhuma em particular”. Já para o lado teista, 16% são protestantes, 10% católicos, 8% judeus, 4% evangélicos e 10% “outras religiões” (4% recusaram responder ou não sabem em que posição ficam). [3]

A Ciência é Onipotente?

Já que Deus não pode ser provado pela ciência, os pseudo-intelectuais resolveram mostrar que há, de fato, um conflito entre ciência e religião. Essa visão vem de uma forma de cientificismo de extrema mente fechada.
O cientificismo diz que a única fonte da verdade é a ciência. Tudo o que não esta de acordo com a ciência moderna é falso e irracional.
O chamado “cientificismo forte” afirma que alguma coisa só pode ser verdadeira se, e somente se, essa coisa for uma teoria ou proposição cientifica. Não há verdades alem das cientificamente provadas e se houver não há motivos para se crer nelas.
O “cientificismo fraco” diz que existem coisas fora da ciência que podem ser provadas, mas a ciência é a forma de conhecimento superior a todas as outras. Alem disso, diz que não há limites para a ciência.
Se pensarmos bem, vemos que essas visões possuem diversos problemas. Considere primeiro a afirmação do “cientificismo forte”, que diz que só devemos acreditar em coisas que são cientificamente provadas. A afirmação “só devemos crer naquilo é pode ser cientificamente provado” não pode ser cientificamente provada. Portanto, é falsa em si mesma.
Há outros problemas também com o cientificismo em geral. Primeiro, ele não permite a atividade de aceitar e defender pressuposições cientificas necessárias para que a ciência seja praticada, tornando o cientificismo um inimigo da ciência. Segundo, há diversas coisas que não podem ser provadas cientificamente mas são racionais de se crer:

- Verdades éticas: A ciência não pode nos dizer o que é certo e errado ou o que é bom ou mal. Você não pode fazer um experimento para ver se os nazistas estavam errados ou não.

- Verdades Matemáticas e lógicas: A ciência pressupõe a matemática e a lógica, portanto tentar prova-las por métodos científicos seria argumentar em círculos.

- Verdades metafísicas: A ciência não pode provar verdades metafísicas como a crença de que existe um mundo externo, que existem outras mentes alem da minha, que o passado não foi criado a cinco minutos com aparência de antigo, etc.

- Julgamentos estéticos não podem ser explicados cientificamente.

Esses são alguns exemplos de coisas que não podem ser explicados cientificamente.

Ciência e Teologia - Como podem se relacionar?

No livro “Filosofia e Cosmovisão Cristã”, William Lane Craig e J. P. Moreland listam seis modelo para integrar a ciência e a teologia:

1- A ciência e a teologia agem em duas áreas diferentes, a natural e a sobrenatural.

Esse modelo diz respeito a certas áreas da teologia e da ciência, como debates sobre a natureza de anjos ou debates sobre a estrutura de moléculas que se concentram em áreas distintas.

2- A ciência e a teologia compreendem duas abordagens diferentes e complementares, alem de descrições da realidade de pontos de vista diferentes. A ciência e a teologia apenas entram em conflito se uma área invade ilegalmente a outra.

Essa área trata da distinção entre causa primaria e causa secundaria. Por exemplo, o que Deus fez no mar vermelho foi uma causa primaria e o que ele fez para sustentar e direcionar o mar do milagre antes e depois do milagre foi causa secundaria.
Causas secundarias são os métodos naturais de Deus operar. Causas primarias são o método incomum de intervenção divina.

3 - A ciência pode preencher detalhes da teologia ou auxiliar na aplicação dos princípios teológicos, e vice-versa.

O modelo 3 é bem direto. Por exemplo, a afirmação teológica de que não devemos deixar nossos filhos irados, e a psicologia pode dar detalhes importantes e praticas dessa afirmação sobre a causa de uma ira em personalidades diferentes.

4- A teologia concede a fundamentação epistemológica e metafísica para a ciência ao justifica ou, pelo menos, ajudar a justificar as pressuposições necessárias da ciência.

Esse modelo propõe que muitas pressuposições cientificas estão a vontade com a fé cristã. Mas outras que não tem justificativa e são apenas baseadas em uma visão naturalista. Desse modo, o teismo cristão não é apenas consistente com essas pressuposições, mas também a melhor explicação para elas.

5- A ciência nos mostra os limites das operações teológicas. A teologia só pode entrar em ação após consultar a ciência. A ciência pode advertir a teologia, mas não o contrario.

De acordo com essa visão, se existem duas interpretações diferentes de pontos de vista teológicos, então a que estiver mais de acordo com a ciência é a preferível. Por exemplo, passagens que dizem que a Terra tem 4 lados não devem ser entendida ao pé da letra.

6- A ciência e a teologia entendem descrições que podem interagir uma com a outra de formas mutuamente encorajadoras e concorrentes.

Essa é a chamada ciência teista. De acordo com essa visão, a ciência e a teologia podem interagir de forma direta entre si. Algumas proposições teológicas podem apoiar ou ganhar apoio da ciência. Por exemplo, a teologia nos disse que o universo teve um inicio e cientificamente isso se tornou mais provável de ser verdadeiro do que falso. [4]
O principal conflito na visão 6 é o debate criação-evolução. A palavra “evolução” tem diversos significados, mas uma forma indiscutível o de que há “mudança através do tempo”. Esse significado, chamado de microevolução, apenas diz que um organismo pode mudar de varias formas dentro de alguns limites. O segundo sentido é o de que todas as espécies vem de um ancestral comum. Essa é chamada de macroevolução.
Existem três grupos que debatem nessa área:

1- Os Criacionistas de Terra Jovem: Acreditam que o universo tem no maximo 20 mil anos, que a criação foi em 6 dias consecutivos de 24 horas. Eles também crêem que o dilúvio de Noé foi global.

2- Os Criacionistas de Terra Antiga: Estes não aceitam o entendimento literal de Gênesis, mas acreditam (e mostram evidencias cientificas e bíblicas) que Deus trabalhou continuamente durante varias eras. (Se quiser tomar essa posição, recomendo o site Reasons to Believe)

3- Evolucionistas Teistas/Criacionistas Evolucionistas: Eles acreditam que a ciência e a teologia são complementares e mostram biblicamente que a evolução não é incompatível com Gênesis. (Se quiser um site de cientistas e teólogos com essa posição, recomendo o BioLogos)

A ciência teista diz que quando cristãos se envolvem em áreas intelectuais como a ciência, eles devem considerar tudo o que possa ser relevante para aquilo, e crenças teológicas devem ser consideradas.
A teologia pode fornecer proposições para orientar a pesquisa (Por exemplo, pode-se considerar que os modelos de universo com o passado infinito são falsos)
A teologia pode ajudar a resolver problemas conceituais internos e externos (Como os problemas da improbabilidade do surgimento da vida)
A teologia pode esclarecer problemas quanto a hipóteses cientificas (como se considerarmos que Deus foi a causa primaria para criar o homem) [5]

Conclusão

A meu ver não há conflito entre a ciência e a teologia. Muitos cientistas do passado andaram junto com a religião em sua carreira e a ciência não pode explicar tudo. Chamar cientistas com PhD de “burros” e “não científicos” só por que são teistas é tão idiota quanto dizer que 2+2=5. Também vimos que há métodos de relação entre a ciência e a teologia e que existem cristãos que aceitam a evolução (e isso será tópico de outro texto também).
Ciência e religião não são inimigos. Nas palavras de John Lennox, “podemos entender completamente como uma maquina funciona, mas isso não quer dizer que o engenheiro não exista”.

Fontes

[1] – What if Jesus Had Never Been Born? – https://www.youtube.com/watch?v=uHLioeL9dYk (28:28)
[2] – E. O. Wilson, “Consilience: The Unity of Knowledge”, p. 31
[3] – Pew Research Religion & Public Life Project – Scientists and Beliefs - http://www.pewforum.org/2009/11/05/scientists-and-belief/
[4] – William Lane Craig e J. P. Moreland, “Filosofia e Cosmovisão Cristã”, p. 433-434
[5] – Idem. p. 438-439

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