quarta-feira, 14 de setembro de 2016

P&R #2 - Cristãos cometem a "falácia do escocês de verdade"?


Olá, Felipe.

Tenho estudado sobre falácias lógicas recentemente e isso me travou num dilema.
Dizer "Se fez isso não é cristão de verdade", "Cristão não faz isso", "Cristão não faz aquilo", "Quem faz/fez isso não é Cristão!", etc, não seria cometer a "falácia do escocês de verdade"? Como penso que sim, já que não encontro outra escapatória lógica, como fugir dessa falácia? Como apontar os reais frutos do Cristianismo visto que, aparentemente, não há como fazer isso sem recorrer a essa falácia lógica?
Vejo muitos irmãos utilizando dessa falácia, e queria saber se tem um jeito de corrigí-los, sem tirar a essência do que realmente querem dizer.


A Paz do Senhor Jesus.

Atenciosamente,
Yasmin

Resposta


Para quem não conhece, a falácia do escocês de verdade é cometida quando uma suposição ad hoc é feita sobre o alvo da critica apenas para fugir da crítica. Por exemplo, se eu digo que vi um corintiano com a camisa do Palmeiras, alguém que respondesse dizendo “Nenhum corintiano usaria a camisa do Palmeiras!” estaria cometendo tal falácia. Outro exemplo seria quando alguém diz que “todo brasileiro gosta de samba!” quando se diz que não gosta de samba.
Yasmin, a falácia pode ser cometida por alguns cristãos, de fato, mas se você pensar no que é ser um cristão, então tal acusação se torna sem fundamento. Por exemplo, suponhamos que um Mexicano, nascido e criado, seja acusado de falar apenas mandarim. Ora, seria bem esquisito não dizer ou pensar que nenhum mexicano fala apenas mandarim. Eles aprendem, em geral, primeiro o espanhol! Da mesma forma, não poderíamos dizer “nenhum cachorro faria isso!”, se nos contarem uma história de um cachorro andando sobre duas patas e falando mandarim!
Note que, se o comentário for contrário ao que define ou à natureza daquele que é criticado, então se justifica a resposta sem nenhuma postulação ad hoc, já que não é uma suposição adicional, mas apenas a atestação de um fato sobre aquele que é criticado.
Partamos para exemplos que estejam mais relacionados ao assunto. Suponha que alguém te diz ser Judeu, porém que não é circuncidado, não guarda o sábado e come todos os alimentos proibidos na Antiga Aliança. Ora, seria no mínimo estranho ver um Judeu assim! Apesar de muitos serem dessa forma e se denominarem Judeus, o que classifica um Judeu de verdade é o cumprimento das normas da Torah. Não é o se dizer Judeu por nascer em uma família judaica que o torna Judeu, mas sim a crença no Deus único do Antigo Testamento e tentar seguir as normas da Antiga Aliança, como a circuncisão e a guarda do sábado. São essas as coisas que caracterizam um Judeu desde a época de Moisés! Então, seria ad hoc, na verdade, dizer que ele é um Judeu, mas não cumpre essas coisas.
Similarmente, quando falamos de um Cristão, ele tem que no mínimo crer que Jesus é Deus e crer em Cristo e nas doutrinas essenciais do Cristianismo. Essas são: Deus existe, Deus é uma Trindade, Jesus Cristo é Deus, o Espirito Santo é Deus, o Pai é Deus, etc. O que o classifica como Cristão são suas crenças básicas. Porém, de acordo com o Novo Testamento, essas crenças não ficam apenas na cabeça do Cristão, é necessário que elas produzam os frutos do Espirito, que aparecem naqueles que verdadeiramente seguem a Cristo. De acordo com o apóstolo Paulo:

Porque as obras da carne são manifestas, as quais são: adultério, fornicação, impureza, lascívia,
Idolatria, feitiçaria, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões, heresias,
Invejas, homicídios, bebedices, glutonarias, e coisas semelhantes a estas, acerca das quais vos declaro, como já antes vos disse, que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus.
Mas o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança.
Contra estas coisas não há lei.
Gálatas 5:19-23

Tiago também enfatiza muito que devemos duvidar do cristianismo de alguém se este for apenas de uma fé morta, que não produz frutos:

Se alguém entre vós cuida ser religioso, e não refreia a sua língua, antes engana o seu coração, a religião desse é vã.
Tiago 1:26

Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras.
Tu crês que há um só Deus; fazes bem. Também os demônios o crêem, e estremecem.
Mas, ó homem vão, queres tu saber que a fé sem as obras é morta?
Tiago 2:18-20

Então, é parte do ser Cristão produzir os frutos do Espirito e evitar as obras da carne. Claramente, como todo Cristão crê, nós nunca seremos perfeitos em todos os aspectos, e falharemos hora ou outra. Porém, não podemos sair por ai dizendo que pessoas como Hitler eram Cristãs simplesmente porque foram na igreja uma ou outra vez, ou porque o Papa supostamente o ajudou durante período de campanha. (Alias, Hitler não era Cristão.)
Suponhamos que alguém faça as seguintes coisas: Trai a esposa, mata os vizinhos, dorme com prostitutas, engana os amigos, dentre outras coisas, mas vai à Igreja todo domingo de manhã, le a Bíblia todo dia e se diz Cristão. Fica mais do que evidente que ele, na verdade, não é um Cristão! Simplesmente porque ele não segue a Cristo e constantemente viola o ensinamento de amar ao próximo como a ti mesmo. E isso já o desqualifica como Cristão:

Se alguém diz: Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu?
E dele temos este mandamento: que quem ama a Deus, ame também a seu irmão.
1 João 4:20,21

Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei, e me manifestarei a ele.
João 14:21


Nós realmente deveríamos duvidar do cristianismo de alguém que não produz frutos! Não seria ele apenas um Igrejeiro? Claro que, se foi apenas um tropeço, Cristo é aquele que pagou por seu pecado. Além disso, também é possível que ele tenha feito tudo isso e depois tenha se arrependido, ido à Cristo, sido perdoado, e agora esta tentando mudar de vida - O que é o processo de santificação.
Portanto, Yasmin, vemos que a falácia pode ser cometida quando se usa uma suposição ad hoc desnecessária. Porém, se a acusação vai contra o que significa o próprio ser do acusado, então tal falácia não é cometida. Seria como se você me dissesse que viu uma pedra liquida e eu respondesse que nenhuma pedra é assim!

Nenhum comentário:

Postar um comentário