Por Randy Everist
Uma das críticas mais famosas
(e supostamente devastadora) ao argumento ontológico de Anselmo vem de Immanuel
Kant. É praticamente indiscutível para quem menciona o argumento. Podemos ouvir
essa crítica até mesmo na Internet. Em praticamente toda instancia em que eu
encontrei essa objeção, uma explicação nunca foi apresentada. Qual é essa
crítica, e o que ela significa?
Kant afirmou que “a existência
não é um predicado”. Para ilustrar o que isso significa, considere uma maçã (ou
um cavalo, um lápis, ou qualquer outro objeto). Podemos descreve-la como sendo “vermelha”,
e “doce” e muitas outras coisas. Tudo isso esta na posição de predicado em uma
sentença. Eles se traduzem em propriedades do objeto como ser vermelho ou ser doce.
Kant mantinha que para algo contar como uma propriedade, esse algo tinha que
nos dizer algo sobre o objeto ao qual adicionou a descrição. O argumento de Kant
é que duas maçãs vão ser idênticas onde elas tiverem todas as mesmas
propriedades, mesmo se nós estipularmos que uma delas exista. Se isso estiver
correto, então a existência não é uma propriedade. Mas se a existência não é
uma propriedade, então Anselmo não pode estar correto quando ele diz que é
maior para Deus existir na realidade do que meramente no intelecto (já que a
diferença entre ambos seria apenas a existência). Então, estaria Kant correto?
Parece que há boas razões para
duvidar que ele esteja. Primeiro, Stephen T. Davis apontou que coisas que
realmente existem possuem propriedades, pela virtude de sua existência (apesar
de serem acidentais), que elas não teriam se não existissem. [1] Por exemplo, o
conceito de cem dólares não possui a propriedade acidental de ter poder de compra no mundo real. [2] Então, há, ou pelo menos
pode haver, diferenças relevantes entre conceitos idênticos trazidos pela existência.
Portanto, a existência, em pelo menos alguns casos, adiciona algo ao conceito.
Segundo, Davis da o exemplo de
um chanceler perfeito. [3] A ideia pode ser extrapolada para uma pessoa
perfeita, ou governante perfeito, ou outra coisa perfeita. Pegue duas pessoas
conceituais as quais possuam esse perfeito X. Suponha que uma pessoa, A,
satisfaça todos os critérios de ser um perfeito X. Porém, A é um personagem fictício
em uma história. B tem uma lista idêntica de atributos, mas no final, vive no noroeste de Montana. Qual o sentido em se dizer que não há diferença entre A
fictício e B realmente-existente? Mas então se segue que a existência pode ser
uma propriedade ou predicado real.
“Mas espere!” eu ouço o
oponente dizer. “Isso não mostra que o conceito de Deus é tal conceito que
permita o predicado de existência!” Talvez, talvez não. Porém, ao menos, foi
demonstrado que a existência pode funcionar em algumas instancias como um
predicado, de forma que duvidas à crítica de Kant foram levantadas. Não será
mais o bastante meramente citar Kant. Terá que ser demonstrado que o conceito
de Deus é tal que existência não pode ser predicada propriamente dele.
Muitos abandonaram a
formulação de Anselmo do argumento por causa dessa crítica. Eu não vejo motivo
para faze-lo. Enquanto há outros argumentos ontológicos que eu prefira (como o
argumento ontológico modal de Plantinga), a crítica de Kant não danifica o de
Anselmo tanto quanto muita gente pensa.
____
[1] Stephen T. Davis, God,
Reason, and Theistic Proofs (Grand Rapids, MI: Eerdmans Publishing, 1997), 35.
[2] Simplesmente não importa
que os cem dólares conceituais possuem a propriedade contra-factual de ter o poder de compra no mundo real,
onde nós diríamos “Se esses cem dólares fossem reais, então eles iriam possuir
a propriedade de ter poder de compra no
mundo real”. Isso porque, qualquer que seja o fundamento de propriedades
contra-factuais, ainda assim permanece que o conceito, de fato, não possui essa
propriedade real.
[3] Davis, 35.
Traduzido de: Christian Apologetics Alliance, Kant's Critique of Anselm: Can Existence be a Predicate?, http://christianapologeticsalliance.com/2013/04/23/kants-critique-of-anselm-can-existence-be-a-predicate/
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