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[Esse texto foi escrito por Wall
em resposta a Sean Carroll, que usou o Teorema da Eternidade Quântica em seu debate (transcrição aqui)
com William Lane Craig. Eu achei interessante (apesar de ter entendido pouco) e
resolvi traduzir.]
Tendo apontado que o teorema BGV
pressupõe a existência de tempo-espaço clássico, Carroll vai a diante e da
alguma evidencia de que o universo não teve um inicio, baseado na mecânica
quântica (MQ):
“Se você precisa invocar um teorema, porque é isso o que você gostaria de fazer ao invés de construir um modelo, eu sugeriria o teorema da eternidade quântica. Se você tiver um universo que obedece as regras convencionais da mecânica quântica, que tenha energia não zero, e as leis da física individuais não mudam com o tempo, esse universo é necessariamente eterno. O parâmetro do tempo nas equações de Schrodinger, dizendo a você como o universo evoluiu, vai de menos infinito ao infinito. Agora, isso pode não ser a resposta definitiva ao mundo real porque você pode sempre violar as afirmações do teorema, mas porque ele usa a mecânica quântica seriamente é um ponto de partida muito melhor para a analise da história do universo. Mas de novo, eu vou manter dizendo que o que importa são os modelos, não princípios abstratos.”
Primeiro, alguma informação de
fundo. Na MQ, há um negocio chamado função de onda Ψ. Esse é o negocio que nos
diz qual a probabilidade de qualquer coisa acontecer, a qualquer momento. Isso
envolve especificar um numero complexo z=a+bi
para cada configuração possível do universo. Números complexos
são bidimensionais, então eles tem tanto um valor
absoluto (ou magnitude) |z|=√a2+b2 quanto
um período (ou direção) no plano
bidimensional. O quadrado de um valor absoluto |z|² da a você a probabilidade
de ficar nesse estado, enquanto o período (ou direção) do numero complexo é uma
peça extra estranha adicional de informação que é especial a MQ (Ah um problema
conceitual profundo sobre o que a função da onda “realmente” significa, mas não vamos entrar nisso aqui)
Na MQ ordinária, a função de onda
do universo muda com o tempo. Se você quer trabalhar com como ele muda com o tempo, você precisa saber a formula total da
energia do universo, escrita
como uma função de posições e momentos de todas as partículas da área.
Assim que você souber o que H é, você então pode usar a equação de Schodinger:
HΨ=iℏ(d/dt)Ψ.
Essa equação te diz que seu
estado Ψ é em um estado com energia especifica HΨ=EΨ (isso se chama um energia eigenstate), então seu período
apenas gira e gira, a um raio proporcional com a energia E dividido pela constante Planck ℏ. Isso é meio
chato, já que isso significa que nenhuma das probabilidades muda de verdade.
Por outro lado, se você tem um estado onde a energia tem incerteza quântica (significando que é na verdade uma superposição
de estados com energia definitiva) então coisas mais interessantes podem
acontecer por causa da interferência entre as energias diferentes eigenstate.
Então, se você sabe o que é H (que especifica as dinâmicas de sua
teoria) e você sabe a função de onda Ψ em um determinado tempo t1, e se
você assume que essa teoria é valida em todos os momentos do tempo, então você
pode trabalhar com o que Ψ é em determinado momento do tempo, passado ou
futuro. E em particular, você sabe o que seria no momento t2, que é arbitrariamente
anterior a t1. Então – o argumento de Carroll – o universo não pode ter tido um
inicio.
Isso é tudo o que o Teorema da
Eternidade Quântica diz. É um pouco bombástico Carroll até mesmo se referir a
isso como um “teorema’, já que é apenas uma reafirmação de um dos princípios
mais básicos da MQ. Como Carroll disse em sua reflexão
pós-debate:
“Por conveniência eu citei meu próprio trabalho como referencia, apesar de ter certeza que não sou o primeiro a descobrir isso; é um resultado trivial quando você pensa sobre isso”
Você ainda pode imaginar que Deus
miraculosamente criou o universo em algum momento do tempo t = 0, e que as leis
da física apenas se aplicam depois desse momento do tempo. Então a física como
é não teria nada a dizer sobre o verdadeiro Inicio, mas apenas o que aconteceu
depois disso. Não há contradição lógica
em dizer isso, mas isso pode fazer algumas pessoas se sentirem inconfortáveis
se – até onde podemos dizer da Ciência – o universo tem que ter durado para
sempre. De alguma forma, essa era a posição Cristã antes da Ciência Moderna,
quando o estudo dos céus pareciam indicar que o universo apenas iria se manter
indo e indo, como um relógio que nunca precisa dar corda. Naquela época,
Cristãos na maioria acreditavam que havia um inicio por razões
filosóficas, ou porque a é dito na Bíblia. Nós agora sabemos que o Universo
se desenvolveu de uma forma simples, e que ele tem existido em sua forma atual
observável por aproximadamente 13.8
bilhões de anos. O caso cientifico para um Inicio certamente é bem mais
conclusivo agora do que era antes, já que naquela época não havia muita coisa
cientifica!
Mas, se o TEQ de Carroll se
aplicar, então não importa quantos fogos de artifício houve no “Big Bang”, isso
poderia apenas ter sido o universo passando de uma forma para outra. Então ele
esta certo?
Provavelmente não. O próprio
Carroll mostra uma falha importante em seu raciocínio, apesar de ele fazer isso de
uma forma cripta que apenas outro físico como eu [Aron] sabe o que isso
significa. Vamos ver de novo:
“Se você tiver um universo que obedece as regras convencionais da mecânica quântica, que tenha energia não zero, e as leis da física individuais não mudam com o tempo, esse universo é necessariamente eterno.”
O que Carroll não diz durante o
debate, é que há boas razões para se crer que a energia do universo é zero (se for definido).
É meio complicado fazer
precisamente o conceito de “energia” na Relatividade Geral. A razão é que a
energia é definida com respeito a como as coisas mudam com o tempo, e tempo é um conceito incerto na
RG. Não há apenas uma noção de tempo, mas na verdade qualquer escolha de
coordenada “t” que você escolher é igualmente
valido. Se não há conceito bem definido de tempo, então não há conceito bem
definido de energia, então o TEQ não se aplica.
Então, quando alguém se refere a
energia na RG, eles precisam de algum tipo de situação especial que os permite
invocar esse conceito. Aqui estão alguns casos que pessoas falam normalmente:
- Se nós dermos zoom em um ponto, nós podemos adotar uma imagem referente a inércia local particular e definir a energia de um objeto usando o sistema de coordenada local. Mas a Relatividade Especial nos diz que há varias boas noções de tempo, e mesmo esses são bons apenas aos arredores de um único ponto, então isso não funciona para o TEQ.
- Se você tem um espaço-tempo que é aproximadamente imutável com respeito a algumas coordenadas especiais de tempo “t”, você pode definir a energia do objeto com respeito a essa coordenada de tempo, enquanto sua área gravitacional é pequena. Isso é chamado de energia matadora (Killing energy), mas isso não é aplicável em cosmologia, já que o universo não esta nem próximo de ser estático (ele esta expandindo).
- Se você tiver um sistema de objetos que por eles mesmos ficam dentro de um espaço infinito de outra forma vazia, então você pode usar a noção de tempo definida por um relógio que esta muito longe do sistema. Isso é chamado de energia ADM, e ela te diz a massa gravitacional efetiva do sistema como medida de muito longe. Mas isso também não se aplica a configurações cosmológicas, já que até onde sabemos o universo não é um aglomerado de matéria em um espaço vazio.
- Finalmente, se você tem um sistema fechado (um sem fronteiras) então uma noção inequivocada de energia associada com a gravitação Hamiltoniana H. No entanto, ela tem exatamente zero para todos os estados físicos permitidos: H = 0!
A grande maioria de procuradores
na gravidade quântica – com, aparentemente, exceção de Carroll – acreditam que
a mesma coisa é provável de ser verdade na gravidade quântica. Isso é, ao invés
da equação de Schodinger, as dinâmicas da teoria são feiras na equação
de Wheeler-DeWitt:
HΨ=0.
Já que H nos diz como Ψ muda com
o tempo, as equações de Wheeler-DeWitt nos diz que o estado quântico não muda
com o tempo! Isso é estranho, já que tudo o que nós sabemos das coisas mudam com o tempo.
Isso significa que o Zeno estava certo e o
tempo é uma ilusão? Bom, nós temos que ser bem cuidadosos com as interpretações
aqui. A verdadeira razão do porque isso acontece em teorias gravitacionais é
porque a escolha
da coordenada de espaço-tempo é arbitraria – você é livre para escolher o
seus pontos no espaço-tempo com qualquer coordenada (x, y, z, t) que quiser:
não há uma maneira “melhor” de fazer isso. (Apesar de eu ter me focado na
Relatividade Geral, físicos esperam problemas similares em quase todas as
teorias de gravidade decentes. Enquanto isso não reintroduz a noção de tempo
absoluto Newtoniano, necessariamente haverá a “restrição Hamiltoniana” dizendo
que apenas estados fisicamente permitidos de um universo fechado são aqueles em
que H = 0.)
Então, quando dizemos que a
função de onde não muda com o tempo, o que isso realmente significa é que a
escolhe da coordenada do tempo é arbitraria. “Tempo” precisa ser medido
relativo com um relógio físico. Não há coordenada absoluta “t” relativa com
movimento de todas as coisas. Então, eu acho que eu diria nesse caso, que o TEQ
“se aplica”, mas de uma forma totalmente trivial. E quando você descobre seu
significado real, isso não nos diz nada sobre se havia ou não qualquer tempo
antes do Big Bang. Então o formalismo da MQ ordinária não é aplicável.
Resumindo, em uma cosmologia
fechada, a energia é zero, e em uma cosmologia aberta ela pode nem ser
definida. Então o apelo de Carroll ao TEQ provavelmente não faz sentido.
Como eu disse a Carroll nos
comentários de suas reflexões pós-debate:
“Sobre o TEQ, na minha cabeça a crença mais conservativa sobre a gravidade quântica é que ela é - assim como na RG – governada por restrições Hamiltonianas ao invés de uma Hamiltoniana ordinária (assim como na MQ padrão). Dessa forma, não é obvio se o TEQ se aplica.
O que mais, já que não há ‘tempo absoluto’ na RG, há muitas maneiras diferentes, inequivalentes de evoluir o espaço pelo tempo. Como Wheeler colocou, tempo é muito livre [Wall usa a palavra “fingered”, mas eu não sei o que significa]. Esse conceito de evolução do tempo vai ser muito súbita para quantificar, e esta longe de ser obvio (para mim) que é proibido para o tempo para começar ou terminar. De qualquer forma, isso é gravidade quântica, então nenhum de nós realmente sabe o que estamos falando!”
E ele respondeu:
“Aron- Esse é certamente um ponto de vista respeitável. É basicamente escolher a opção de que a energia é zero, o que é definitivamente possível. E se esse se tornar o caso, o tempo certamente pode ‘acabar’, mas em um sentido muito engraçado, já que ‘tempo’ apenar emergiu para começar.
Mas a outra opção, de que a energia não é zero e o tempo ordinário dependente da equação de Schrodinger se aplica, é pelo igualmente menos razoável (talvez até mais). Nosso exemplo de melhor entendimento da gravidade quântica é de que a correspondência AdS/CFT, onde a teoria é mais cuidadosamente definida em termos da teoria da fronteira Hamiltoniana – em que a evolução convencional de Schrodinger se aplica perfeitamente. Minha suspeita é a de que a gravidade quântica vai funcionar similarmente em outros casos também. Mas como você disse, é gravidade quântica, então nós somos permitidos a especular mas não a agir como se nós soubéssemos a resposta.”
AdS/CFT é uma dualidade famosa
entra uma teoria da MQ ordinária (o CFT) e a teoria gravitacional (das cordas)
com a constante cosmológica negativa. Nesse caso, há um H bem definido que não
é zero, mas isso é porque você tem um monte de matéria em um espaço AdS vazio,
então, você pode usar a definição ADM Hamiltoniana. (Essa dualidade nos diz
coisas bem interessantes sobre os aspectos gerais da gravidade quântica, mas
isso provavelmente não se aplica ao nosso próprio universo, que tem a constante
cosmológica positiva, junto com outras considerações)
Relatividade Geral prevê (A) que
é H =/= 0 para matéria em um espaço AdS vazio, e (B) é H = 0 para universos
fechados. Isso não faz sentido para mim, dizer que porque a teoria das cordas
concorda com a RG sobre (A), ele provavelmente discorda com RG sobre (B). Para
mim, a coisa mais conservativa a dizer é que ambos os fatos continuam a ser
verdade. Alem disso, (B) é bem mais provável de descrever o universo real do
que (A) é.A
Apesar disso, nós dois dissemos para
cada um de nós, ninguém sabe na verdade com certeza como a teoria de gravidade
quântica correta vai ser formulada. Claro, não há nada de errado em Carroll
colocar sua opinião pessoal no
debate – Eu não posso reclamar sobre isso após Craig colocar as minhas opiniões!
Mas eu acho que ele poderia ter sido mais claro de que isso era sua opinião
pessoal, e que, dada crenças “convencionais” sobre a gravidade quântica, o TEQ
provavelmente não pode ser aplicado em configurações cosmológicas.
Traduzido de – Aron Wall, “Undivided
Looking: Did the Universe Begin? IV: Quantum Eternity Theorem”
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