Uma acusação comum contra visões
diferentes de Gênesis é a de que “são motivadas pela ciência”. Quem usa esse
argumento quer dizer que, quem interpreta Gênesis de forma diferente, esta
sendo motivado por algo de fora, dando a esse algo mais autoridade que as
Escrituras.
Seriam interpretações diferentes de Gênesis motivadas por “outra autoridade”?
O que os Pais da Igreja dizem?
Os Pais da Igreja mais influentes
da história tinham diferentes interpretações de Gênesis baseando-se apenas nas
Escrituras. Justino Martyr (100-165) em “Dialogue with Trypho the Jew” [Dialogo
com Trypho o Judeu], e Irineu (130-200) em “Against Heresies” (Contra Heresias)
argumentavam citando Salmos 90:4 e 2 Pedro 3:8 que os seis dias de criação não
poderiam ser períodos de 24 horas, pois Adão tinha sido dito que iria morrer no
dia em que comesse do fruto proibido, mas ele viveu cerca de 900 anos.
Outros Pais da Igreja posteriores
argumentavam para uma visão não-literal dos dias de Gênesis. Clemente de
Alexandria (150-215) argumentava em seu “Stromata” que os dias de criação eram
indicadores de prioridade que iam aumentando em pensamento divino, mas não
representativos de uma ordem temporal, já que os dias não poderiam ocorrer no
tempo, pois este foi criado junto as coisas que foram feitas.
Origen (185-254) argumentava também
em seu “Against Celsus” que seria um erro ler os dias de criação como literais,
já que o sol não havia sido criado até o quarto dia e que não poderiam haver
dias com o céu sendo criado no segundo dia. Santo Agostinho (354-430) em “Cidade
de Deus” e “O Sentido Literal de Gênesis” refletia sobre as implicações de Deus
criando o tempo sob sua visão de que Deus se mantinha fora do tempo. De fato,
Agostinho cria que Deus criou toda a criação instantaneamente, do seu inicio até
a Nova Jerusalém. Ele diz:
“Que tipo de
dias eram esses [os de criação] é extremamente difícil, ou talvez impossível para
nós de conceber, imagine explicar em palavras” [Santo Agostinho, Cidade de
Deus, Livro XI, Capitulo 6]
E conclui:
“Pelo menos nós
sabemos que [eles são] diferentes dos dias ordinários que nós conhecemos”
[Agostinho, The Literal Meaning of Genesis]
Os Dois Credos das Igrejas Antigas
O Credo Niceno, composto pelo
Concilio de Nicéia (325 d.C.):
Cremos em um
só Deus, Pai Todo-Poderoso, o Criador do céu e da terra, das coisas
visíveis e invisíveis. E em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, o
Unigênito de Deus o Pai, o Unigênito, que é da essência do Pai. Deus de Deus,
Luz de Deus, Luz verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado e não feito; da natureza
mesma do Pai, por quem todas as coisas vieram a existir, no céu e na terra,
visíveis e invisíveis. Quem de nós a humanidade e para nossa salvação desceu
dos céus, se encarnou, foi feito humano, nasceu perfeitamente da Santíssima
Virgem Maria pelo Espírito Santo.
Note que só diz que Deus é o
Criador dos céus e da Terra, mas não diz nem o método e nem a ou em quanto
tempo.
Agora, o Credo dos Apóstolos, que
apareceu por completo no quinto século, mas teve suas raízes no primeiro e
segundo século:
Creio em Deus
Pai, Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra;
e em Jesus
Cristo, seu único Filho, nosso Senhor,
que foi
concebido pelo poder do Espírito Santo, nasceu da virgem Maria;
padeceu sob
Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado;
desceu à mansão
dos mortos; ressuscitou ao terceiro dia;
subiu aos
Céus; está sentado à direita de Deus Pai Todo-Poderoso,
de onde há de
vir a julgar os vivos e os mortos.
Creio no
Espírito Santo,
na Santa
Igreja católica, na comunhão dos Santos,
na remissão
dos pecados,
na
ressurreição da carne,
na vida
eterna.
Amém.
Novamente, não há menção a duração
da criação, a idade da criação e nem ao método e criação.
A razão pela qual coloquei isso aqui, é para ver que nem as igrejas antigas consideravam isso algo de importância. O fato é que não é algo necessário para a salvação, e não devemos forçar a ser. Os pais da igreja não sabiam como interpretar esses dias e a história da criação.
A razão pela qual coloquei isso aqui, é para ver que nem as igrejas antigas consideravam isso algo de importância. O fato é que não é algo necessário para a salvação, e não devemos forçar a ser. Os pais da igreja não sabiam como interpretar esses dias e a história da criação.
O Movimento de Terra Jovem é recente
Antes do período final do século 19 a correta interpretação de
Gênesis era desconhecida. De fato, foi apenas com os escritos e alegadas visões
da profeta Adventista, Ellen White, que o movimento Criacionista de Terra Jovem
começou. Antes dela, alguns geólogos tentavam argumentar para uma terra
recente, e do lado da teologia, haviam Martinho Lutero e João Calvino. Porem,
citar estes como defesa para dizer que o movimento de terra jovem não é recente
seria reflexo de um mal entendimento do que aconteceu. Certamente existiram
Criacionistas de Terra Jovem antes das alegadas visões de Ellen White, mas o
movimento de criação recente como é conhecido e ensinado hoje só veio a se
manifestar depois das ditas visões dela. Alem disso, João Calvino e Martinho
Lutero eram geocentristas, algo que ninguém, nem ao menos CTJ crêem hoje em
dia.
Mesmo se fosse verdade, e daí?
Mesmo se a tradição fosse a de
que tudo foi criado a 6.000 anos em seis dias de 24 horas, isso não iria
significar nada. Deus nos deu dois livros: A Bíblia e o Livro da Natureza. Este
segundo é o único que a Bíblia diz que Deus também é o autor. O que isso
significa é que um não pode contradizer o outro. Deus não iria criar algo que
Ele sabia que os humanos iriam estudar que pudesse dar resultados tão
diferentes. Então, minha visão de inerrancia é a seguinte:
Premissa 1 – A interpretação humana de terra jovem diz que a Terra tem
6000 anos.
Premissa 2 – Se a Bíblia disser que a Terra tem 6000 anos, então a Bíblia
esta errada.
Premissa 3 – A Bíblia não pode estar errada.
Conclusão – Portanto, não importa o quanto você defenda biblicamente
sua interpretação, a interpretação humana de terra jovem das Escrituras esta
errada.
Essa é a melhor forma de ver a Bíblia, pois coloca ela acima da interpretação humana tando dela mesma quanto da ciência, mas tenta ver ambos de forma consistente e complementares.
Tanto a Bíblia quanto a Natureza
nos falam da revelação de Deus. Um é um Livro escrito por autores humanos
inspirador por Deus. O outro é a criação direta de Deus. Com isso em mente,
podemos ver um problema em quem diz “isso é armadilha de Satanás”. Dizer que
Satanás pode manipular a natureza e seu estudo é menosprezar o poder de Deus
como Criador. Alem disso, por que Satanás iria fazer isso com algo que não é necessário
pra Salvação?
Alguns podem tentar rebater
dizendo “mas por que a interpretação humana da ciência não pode estar errada?” Simples:
Um dos pilares da ciência moderna é o de que se algo é consenso da maioria, então
essa idéia é mais provável de ser verdade do que não. Alem disso, a maioria crê
em uma Terra de 4 bilhões de anos. Mesmo se a maioria estiver errada, esse
numero não iria diminuir para 6000 anos. Uma possível resposta a isso é a que “eles
só acreditam por causa de sua idéia pré-concebida de que a evolução é verdade”.
Porem, isso seria cometer a Falácia Genética: Tentar invalidar uma crença ou
posição atacando como ela possa ter se originado. E também, o mesmo argumento
pode ser feito contra a ciência de Terra Jovem. Toda ela pressupõe que a Terra
tem 6000 anos. E isso é algo a se pensar: Existem criacionistas de Terra Jovem
que variam de 6000 anos a 20000 anos. Se cientistas fizerem a ciência deles com
seus variados pressupostos, chegarão a resultados diferentes. Por exemplo, Adauto
Lourenço crê que o universo tem 6000 anos. Mas, existem criacionistas que crêem
que ele tem 10000. Quem estaria certo? Temos que ir atrás do resultado sem
pressupor nada.
“Mas, se você começar com a Bíblia...”
Se eu começar com a Bíblia, posso
chegar na mesma conclusão dos mais influentes Pais da Igreja. Alem disso,
começar com a Bíblia, pressupondo sua verdade, é raciocínio circular.
“A Bíblia diz isso” –
“Portanto essa visão é verdade” – “Porque a Bíblia diz isso”
Deus sabia que os céticos iriam
estudar a natureza. Sendo assim, Ele não faria algo de forma que tivesse que
pressupor a veracidade de Sua Palavra. Não podemos pressupor que a Bíblia seja
verdade e argumentar a partir daí, devemos argumentar a partir da natureza para
mostrar ao cético que a Bíblia é verdade.
“Mas existem cientistas criacionistas de terra jovem!”
Sim, mas estão na mesma proporção
que historiadores que não crêem no Jesus histórico: São uma minoria.
“Criacionismo Bíblico” e a arrogância
Aqueles que chamam o Criacionismo
de Terra Jovem de “Criacionismo Bíblico” como única forma de interpretar os
textos de criação da Bíblia, são arrogantes por chamar outros "tipos" de criacionistas de "não-biblicos" e colocam a sua interpretação
humana acima da Bíblia. Todos os Cristãos, seja de Terra Jovem, Terra Antiga ou Teísta Evolucionista crê que a Bíblia é 100% a Palavra de Deus completamente isenta de erros. É verdade, a Bíblia diz uma coisa, mas justamente a
parte da criação é bem vaga. Como Santo Agostinho colocou:
“De maneiras
que são tão obscuras e muito alem de nossa visão, nós encontramos nas
Escrituras Sagradas passagens que podem ser interpretadas de varias formas
diferentes sem prejudicar a fé que nós recebemos. Nesses casos, nós não
deveríamos nos apressar e ficar apenas de um lado, se o progresso na busca pela
verdade justamente acabar com essa posição, nós caímos com ela.” [Agostinho,
Idem]
O texto bíblico sobre a criação é extremamente vago. Isso porque como falava das origens ele deveria ser escrito de forma que pessoas de todos os tempos iriam compreender.
Conclusão
A verdade é que a Palavra de Deus
e a Criação de Deus devem ser complementares. A Bíblia não é um livro de ciências,
e tentar ler ciência nela seria como buscar matemática em um livro de português.
Não é o caso de que tiramos a autoridade
da Bíblia para dar mais importância a ciência. Mas sim que lemos a criação de
forma consistente e harmônica. De forma que não só faça sentido como também não
afaste as pessoas de Cristo.
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